segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

MEU DILEMA


O ano novo virá com seus poemas,
Que virão à minha mente num degredo;
Revelando, quem sabe, certos segredos,
Ou solucionando velhos problemas.

No decorrer do tempo, o meu dilema
Tem sido esse, pois tarde, ou muito cedo,
Apavora-me o cerne tanto medo,
Por revelar meu íntimo num esquema.

E, por mais que, meu interior medra,
No meu caminho, há milhões de pedras,
Que meus versos, um dia revelarão...

Espero que mais problemas resolvam.
E, nunca, em mentes férteis, se dissolvam,
E possam nunca mesmo ter sido em vão.

Miguel de Souza









domingo, 11 de novembro de 2018

FOLGA

Deitado na cama,
pego um livro.
Aliás, pego o livro:
"Esconderijos do tempo",
do Quintana.

E me extasio com os poemas ali contidos.

Miguel de Souza

sábado, 27 de outubro de 2018

ENTRE TEXTOS

QUADRILHA

João amava Tereza que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Tereza para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

Carlos Drummond de Andrade
In. Alguma Poesia


POEMA FLAMENGUISTA

Flamengo ganhou do Corinthians que ganhou do Palmeiras
que ganhou do Santos que ganhou do Botafogo que ganhou do Vasco
que não ganhou de ninguém.
Flamengo foi campeão brasileiro, Corinthians se classificou pra Libertadores,
Palmeiras para a Sulamericana, Santos ficou na série "A",
e o Vasco desceu à segunda divisão
donde nunca deveria ter saído.

Miguel de Souza

segunda-feira, 22 de outubro de 2018

PARA MANAUS

Dizem que tu não tens primavera!
E, tampouco, que tens outono!...
Mas, o Supremo Deus, lá do seu trono,
não se esqueceu de Ti... Oh! cidade vera!

Se alguma outra cidade... (Quem me dera!)
Fosse igual a Ti, tela de cromo!
Pelo verde, vermelho, azul... Que somos!
Ou, pelo menos, se mais cor tivera!

E, ao invés de quatro, fossem duas
as estações efêmeras do ano,
e as outras duas fossem perenes...

Eu me extasiaria com as tuas
cores, com os olores do cotidiano,
com o trocar das folhas tão solenes!

Miguel de Souza
In:. Poemais
P. 61

sábado, 13 de outubro de 2018

MAXIMÍNIMAS - SONETOS SOBRE AFORISMOS


Já está no mercado o meu segundo livro de poemas: maximínimas - sonetos sobre aforismos. São sonetos sobre aforismos que andei colhendo a partir dos aforismos de "Meu ovo esquerdo", livro de Dori Carvalho, "O avesso das coisas", de Carlos Drummond de Andrade e aforismos de autores universais.

MIGUEL DE SOUZA se propôs um divertido jogo dos mais sérios. Após ler livros de aforismos dos poetas Dori Carvalho e Carlos Drummond de Andrade, ele foi tomado por uma vontade-necessidade de escrerver clássicos sonetos que exibissem sua própria leitura dessas máximas tão singelas. São interpretações com toques espirituais, religiosos, políticos, de humor e filosofia, que refletem como as frases o atravessaram. Ele cita uma simples máxima do poeta em questão, para depois tecer seus sofisticados versos, rimados e metrificados, comentando-os. Os comentários, porém, não esgotam as possibilidades de interprertação, ao contrário: abre portas não óbvias, que indicam caminhos incomuns, que podem ser objetos de outros caminhos, numa sucessão que somente as obras de arte podem produzir. Diante da máxima de Drummond "Não é difícil ser amado por duas pessoas; difícil é amar as duas", por exemplo, ele tece versos como "[...] Mas, ser amado em dose dupla, / não sentiria, eu sei, nenhuma culpa / por isto. E as duas , eu não as amaria. [...] Já sou compromissado co'a poesia."
O poeta ainda conta com outras máximas de outros escritores, ótimos frasistas, como Clarice Lispector, Fernando Pessoa ou Oscar Wilde, para se inspirar, num resultado múltiplo. Um livro que é, no mínimo, o máximo. Impressionado com a potência poética de frases definitivas de autores como  os poetas Carlos Drummond de Andrade e Dori Carvalho, Miguel de Souza resolveu "responder" ao chamado - das musas (despertadas pela altura dos aforismos), ou dos próprios adágios, que lhe inculcaram questões e sugeriram caminhos. O poeta, então, traçou as famosas estrofes em 4,4,3,3 versos do soneto clássico (todo metrificado e rimado) para dar sua contribuição para a fortuna interpretativa e apontar outras trilhas bem pessoais e frutíferas.   

 

domingo, 30 de setembro de 2018

POETA


Na grande fábrica do mundo,
Se me perguntarem qual o meu ofício,
Direi como funcionário:

Trabalho no estoque:
Selecionando, experimentando, arrumando palavras...
Separando-as por ordem.
Cada qual no seu devido lugar.

Emprestando-lhes muitas vezes novos significados.
E armazenando-as numa posição estranha
No corpo de um papel.

Para que o mundo possa me chamar de poeta.


Miguel de Souza







sábado, 22 de setembro de 2018

TROVOADA DE TROVAS

Com ela não troco olhares,
não troco porque não sei
olhar para quem tanto amo,
sem dizer que sempre amei!

Miguel de Souza

sábado, 15 de setembro de 2018

OLHO PARA ELA


Olho para ela num dia covarde e sem graça.
Numa manhã de domingo,           
Ou tarde de sábado,
Olho para ela...

Olho para ela numa segunda preguiçosa,
Ou terça-feira cinzenta.
Numa quarta-feira farta olho para ela.

Olho para ela numa quinta extinta.
Ou numa sexta-feira extra,
Olho para ela.

Miguel de Souza

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

SOBRE POEMAS

Julho, 25 - Aturdido, leio no jornal o artigo em que se analisa um de meus poemas à luz das novas teorias lítero-estruturalistas. Travo conhecimento com expressões deste gênero: "dinamismo dos eixos paradigmáticos", "núcleo sêmico", "invariante semântico horizontal", "forma de referência parcializante e indireta", "matriz barthesiana"... O poeminha, que me parecia simples, tornou-se sombriamente complicado, e me achei um monstro de trevas e confusão.

Carlos Drummond de Andrade
In:. O observador no escritório.
P:. 174.

sábado, 1 de setembro de 2018

ENTRE TEXTOS


estou cansado
dessa gente que nunca ouviu um
poema do Drummond
estou cansado
dessa gente que nunca sentiu a
voz de Elis
estou cansado
dessa gente que nunca estudou
Darcy Ribeiro
estou cansado
dessa gente que nunca assistiu a
uma peça de Plínio Marcos
estou cansado
dessa gente que nunca ouviu
uma Bachiana de Villa-Lobos
estou cansado
dessa gente que nunca aprendeu
com Ariano Suassuna
estou cansado
dessa gente que nunca viu
Fernanda Montenegro no palco
estou cansado
dessa gente que nunca leu um
romance de Milton Hatoum
estou cansado
dessa gente que nunca brincou
com Antônio Nóbrega
estou cansado
dessa gente que nunca viu um
filme de Glauber Rocha
estou cansado
dessa gente que nunca olhou as
pinturas de Portinari
estou cansado
dessa gente que nunca chorou
ouvindo uma canção de Chico
Buarque
estou cansado
dessa gente que nunca dançou
um samba de Paulinho da Viola
estou cansado
dessa gente que nunca viu o
Ballet Stagium
estou cansado
dessa gente ignorante e estúpida
estou cansado
dessa gente que nunca quis
mudar o mundo
estou cansado
dessa gente que nunca morreu
por um grande amor
estou cansado
dessa gente que nunca lutou por
nada
estou cansado
dessa gente hipócrita e
mesquinha
estou cansado
dessa gente que nunca foi gente
estou cansado
dessa gente que nunca
Estou cansado
dessa gente
Estou cansado

Dori Carvalho



Indignação
                                                     Pro Dori Carvalho, primeiro a se indignar

Eu tenho asco dessa gente reles
Que nunca ouviu um poema do Drummond!*
E, por isto, não sabe o que é bom.
Nem viu o amor de Florbela por Apeles.

Eu tenho raiva dessa gente rude
Que nunca sentiu a voz de Elis!*
E, por isto, não soube ser feliz,
Nos anos louros dessa juventude.

Eu tenho nojo dessa gente fraca,
Sem atitude, sem brilho, opaca,
E que nunca aprendeu com o Suassuna!*

Tenho cólera dessa gente vil, a
Maior vergonha desse Brasil,
E que nunca ouviu o canto da graúna!

Miguel de Souza

*Versos de Dori Carvalho






sábado, 18 de agosto de 2018

O BRASIL QUE EU QUERO PRO FUTURO


Quero um Brasil que seja diferente
Desse Brasil que por aí pulula;
Sem ter, ao menos, essa pobre gente,
Que aos cantos o seu triste canto ulula.

Quero um Brasil tão digno e transparente                   
Como o Brasil do Presidente Lula;
Não esse Brasil que por aí perambula,
Sem direção, sem seta, descrente!

Quero um Brasil tão digno quanto honesto,
Sem manifestações e sem protestos,
Um Brasil que não reine no monturo!   

Quero um Brasil com igualdade social,
Quero um Brasil onde o bem vença o mal,
Esse é o Brasil que eu quero pro futuro!

Miguel de Souza 




sábado, 11 de agosto de 2018

saudade

                          para meu pai

a saudade o tempo leva,
e traz no dia seguinte...
e soma-se mais de vinte
anos  que, naquela leva,
te foste deste convívio,
habitar em outra esfera.
de repente esta atmosfera,
a teus pés tornou-se ínvio.
agora és todo abstrato,
-fiel criatura no adro-,
a tua imagem num quadro,
imitando o teu retrato,
               dignifica a memória,
               daquele que ficou na história.

miguel de souza

sábado, 28 de julho de 2018

SER

O filho que não fiz
hoje seria homem.
Ele corre na brisa,
sem carne, sem nome.

Às vezes o encontro
num encontro de nuvem.
Apoia em meu ombro
seu ombro nenhum.

Interrogo meu filho,
objeto de ar:
em que gruta ou concha
quedas abstrato?

Lá onde eu jazia,
responde-me o hálito,
não me percebeste,
contudo chamava-te

como ainda te chamo
(além, além do amor)
onde nada, tudo
aspira a criar-se.

O filho que não fiz
faz-se por si mesmo.
Carlos Drummond Andrade


O filho
               
                  Paráfrase do poema “Ser” de Carlos Drummond de Andrade        

Onde está você?
Já tenho seu nome!
Mais um de arcanjo,
Másculo de homem.

Sei que falta a fonte,
Que falta o depósito
Onde derramarei o
Sêmen de propósito...

É longa essa espera!
Tenha paciência,
Um dia nascerá,
 Envolto em ciência,

O filho que não fiz.
Mas hei de fazê-lo!
E serei feliz,
Feliz por tê-lo!

O seu nome algum,
Será?... bem, nada
De nome comum,
Como o próprio Miguel.

O seu nome algum,
Será Rafanael.

Miguel de Souza






sábado, 21 de julho de 2018

sábado

músicas antigas na rádio
um silêncio de tristeza
rebenta meus tímpanos
já não sou mais eu

ou melhor, achei minha identidade!

sou esse que habita
em nada; porque o nada
habita em mim...

um vácuo me persegue
uma ausência me aborda
e uma lacuna me transforma
nesse homem triste que lês

caro leitor!


Miguel de Souza

sábado, 14 de julho de 2018

"ESTALTA" VIVA

Imóvel como uma esfinge,
de "coca", bem firme à proa
de uma vetusta canoa,
o "caboco" rijo, finge
ser uma "estalta" viva!
Nem a "mutuca" que pousa,
e nem uma 'galça" que ousa
voar, mas logo se esquiva,
tiram a concentração
do "caboco", que intacto,
não causa nenhum impacto,
armado com seu arpão!
             Envolto em "mureru",
             na pesca do pirarucu.

Miguel de Souza
In: Poemais
P.66

sábado, 7 de julho de 2018

DEPOIS DA COPA


Depois da Copa tudo volta ao normal!
Chega de análises e esquema tático;
E de tantos problemas matemático,
Para classificar-se e coisa e tal!

E se não conseguirmos, não faz mal;
Amanhã voltaremos ao prático...
Desabafemos num soneto sáfico,
Todas as nossas falhas, afinal!

Há uma Copa pra gente em cada esquina,
P’lo menos é o que a vida determina,
Pra lutarmos com muita garra e raça!

Logo após os noventa minutos,
Colheremos dessa árvore, o mor fruto...
Ao soerguermos, nesse campo, a taça!

Miguel de Souza





domingo, 1 de julho de 2018

O GIGANTE


O gigante de braços abertos
Para mim, nesta vasta multidão!
É este mesmo gigante, que por certo,   
Cerra os braços sem muita contrição!

Desde quando garoto muito esperto,
Que pisei no teu nobre coração,
 Foi que senti o desejo sempre perto,
 De pisar no teu chão com emoção!

Quando é que vou pisar teu solo, enfim,
 E sentir toda essa emoção assim,
 Como poeta menor da minha zona!

 Quando é que em teu âmago direi versos,
 Oh, cobiçoso teatro do universo
 Dessa plêiade do nosso Amazonas!         

 Miguel de Souza 


domingo, 24 de junho de 2018

TROCA


O inverno se despede. Chega junho.
O calendário, neste instante, meia.
O perigo de tantas doenças freia, e
Recebo certa carta escrita a punho,
   
Do maior escritor que há nesta aldeia, ao 
Qual respeitosamente, eu não alcunho!
E dou a Ele, o meu triste testemunho,
O motivo óbvio de estarmos na peia!

E inserido no rol dos poetastros,
Vejo luzir o rei maior dos astros,
Nessa interminável lona azul.

Por essas e por infindáveis vezes,
Aqui em Manaus, a cada seis meses,
Troca-se a estação no meu iglu.

Miguel de Souza



sábado, 16 de junho de 2018

MOTE E GLOSA

No que tange a futebol,
não torço mais pro Brasil!

Ninguém me tira do tino,
que o Brasil se vende em copa!
O seu esquadrão ou sua tropa,
não honra o que diz o hino!
Desde quando era menino,
com meus irmãos e meu tio,
torcia com mais de mil,
debaixo de chuva ou sol!
         No que tange a futebol,
          não torço mais pro Brasil!


Miguel de Souza
In: Décimas (Mote e glosa)

sábado, 9 de junho de 2018

INTRATEXTUALIDADE


Intratextualidade é quando o poeta se refere a um verso seu de outro poema. Quando ele recupera esse verso no poema atual. Ou faz menção de outro verso no poema que está praticando. Exemplos:

Madrigal tão engraçadinho

Teresa, você é a coisa mais bonita que eu vi até hoje na
minha vida, inclusive o porquinho-da-índia que me
deram quando eu tinha seis anos.

Manuel Bandeira

Porquinho-da-Índia

Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!

Levava ele prá sala
Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...

- O meu porquinho-da-índia foi minha primeira namorada.
                                                                 Manuel Bandeira

 Sonetos

Já falei tanto... E tenho tanto, tanto
A dizer em poemas desta forma
Que minha inspiração não se conforma
Com a dor impregnada no meu canto!

Nesse cito o sagrado, o sacrossanto
Nesse outro, uma procura, uma reforma
Íntima para a dor que me transforma!
E, nesse, falo da magia e encanto

Que há nos versos de um amigo meu...
... Foi tanto, tanto tema que se deu
Em poemas tão belos quanto fartos!

Nesse digo: a felicidade é possível!
Nesse, digo que minha mãe é incrível,
E agradeço a ela pela dor do parto!

Miguel de Souza


VOCÊ É INCRÍVEL

Foi você, Mãe querida, quem deu a luz 
a mim, que vim ao mundo indefeso!
Por isso, minha Mãe, jamais meu desprezo.
Por isso, hoje sou eu quem a conduz.

Foi em você, Mãe humilde, que pus
minha boca faminta, sem peso.
Pude sugar o leite lícito e ileso,
e jamais ao seu ofício me opus.

Foi você, minha Mãe, quem me teve,
é por isso que todo filho deve
ser sempre o melhor filho possível.

Quantas vezes suguei seu seio farto!
 Eu lhe agradeço pela dor do parto,
oh, Mãe querida, você é incrível!

Miguel de Souza
In: Poemais
P. 60

sábado, 26 de maio de 2018

COPA DO MUNDO


O poeta Carlos Drummond de Andrade se despediu da copa de 1978 com um poema:


FOI-SE A COPA?

Foi-se a Copa? Não faz mal.
Adeus chutes e sistemas.
A gente pode, afinal,
Cuidar de nossos problemas.

Faltou inflação de pontos?
Perdura a inflação de fato.
Deixaremos de ser tontos
se chutarmos no alvo exato.

O povo, noutro torneio,
Havendo tenacidade,
Ganhará, rijo, e de cheio,
A Copa da Liberdade.



E eu, vinte anos depois, dei as boas vindas à copa de 1998. Confiram:

Bem-vinda!

Que seja bem vinda a copa,
Junto ao mês de junho...
E que, do Brasil, a tropa
Aja com garra e punho!

Que daqui do nosso campo,
Faremos a nossa parte!
Com um futebol bem amplo,
Seremos campeões com arte!

E, logo após, a copa que finda,
Reinicia a nossa luta!
Que esta copa seja bem vinda,
Nossa copa da labuta!

Miguel de Souza 






domingo, 20 de maio de 2018

EU NÃO SOU BRASILEIRO

Eu não sou brasileiro
de um Brasil desonesto.
E por causa dessas coisas,
deixo aqui o meu protesto.

Eu não sou brasileiro
de um Brasil desigual.
De um Brasil mau-caráter,
onde a fome não faz mal.

Eu não sou brasileiro
de um Brasil corrompido.
Onde se prende o inocente
e estão soltos os bandidos.

Eu não sou brasileiro
de um Brasil sem vergonha,
onde a corrupção é quem manda.
Isto tudo me  envergonha.

Eu não sou brasileiro
de um Brasil cafajeste,
que só olha para o Sul
e esquece do Nordeste.

Eu não sou brasileiro
de um Brasil sem moral.
De um Brasil sem pão à mesa,
sem trabalho e capital.

Miguel de Souza

domingo, 13 de maio de 2018

DIA DE NOSSA SENHORA DE FÁTIMA

LEMBRANÇA DE FÁTIMA

Em Vosso solo urbano
milhões de formigas
laboram pela salvação.
Procissam com cânticos no Vosso dia
Senhora de Fátima.

A cidade Vos pensa
                Vos reza
                Vos venera
Oh, adorável Santa!

Àquelas três crianças...
Por isso o Vosso nome
                                      na cidade!
Àquelas três crianças...
                                                        Por isso Vos gloriamos
                                                                                         de verdade!

                                                  Oh, Nossa Senhora de Fátima!

                                                           
                                                             Miguel de Souza



sábado, 12 de maio de 2018

DIA DAS MÃES

parto

do molambo da língua paralítica
é que surge por esse transporte!
vem rompendo igualmente a um corte,
pela matéria tênue, fraca, raquítica...

e chega ao vão da boca oca e mítica,
essa exígua carcaça como suporte...
elo profundo dentre a vida e a morte,
motivo sórdido de horrendas críticas.

e nesse esbravejar sem deleite,
reclama, ao menos, uma gota de leite,
e sua mãe o sustém nos seios fartos!

depois do aconchego dessa cena,
a criança se recolhe tão serena,
nos recônditos simples de seu quarto.

miguel de souza

domingo, 6 de maio de 2018

PERIPÉCIAS

Ela rola no peito
ela roça no pé
ela parte com efeito
e a torcida grita olé!

Ela quica, ela salta
ela voa, ela pousa...
Na cobrança de uma falta
deitar na rede, ela ousa!

Ela para, ela gira
ela corre e não cansa.
De quem falo? Confira
com o ponta-de-lança!

Ela cruza, faz curva
ela sobe, ela cai...
E, suavemente, na luva
do goleiro, ela vai!

Ela vai, ela vem
ela pinta, ela borda.
É minha! E de ninguém!
E a alegria se transborda!

Ela deita, ela rola
ela faz o seu show!
A maior peripécia da bola
é quando acontece o gol!

Miguel de Souza

sábado, 28 de abril de 2018

DESFECHO


A história de ontem, de hoje, de sempre...
Mostra-nos que quem foi a favor do povo,
Se lascou, se lasca e se... de novo,
Quem fez ou quem faz parte dessa trempe!

E se você não lembra. Por favor, lembre
Da história genuína como o ovo,
Que se renova a cada hera num renovo,
Para mostrar a ingratidão! Relembre...

Verás que o povo se voltará contra,
Achando seu comportamento afronta,
E apoiará, por fim, sua condenação!

Se minha atitude, talvez, não o agrade,
Temo por ir também atrás das grades,
Como o ex-Presidente desta nação!

Miguel de Souza

sábado, 21 de abril de 2018

SAUDADE

"Li o Eu na adolescência e foi como se levasse um soco na cara. Jamais eu vira antes, engastadas em decassílabos, palavras estranhas como simbiose, mônada, metafisicismo, fenomênica, quimiotaxia, zooplasma, intracefálica... E elas funcionavam bem nos versos! Ao espanto sucedeu intensa curiosidade. Quis ler mais esse poeta diferente dos clássicos, dos românticos, dos simbolistas, de todos os poetas que eu conhecia. A leitura do Eu foi para mim uma aventura milionária. Enriqueceu minha noção de poesia. Vi como se pode fazer lirismo com dramaticidade permanente, que se grava para sempre na memória do leitor. Augusto dos Anjos continua sendo o grande caso singular da poesia brasileira." Disse Carlos Drummond de Andrade.

Hoje que a mágoa me apunhala o seio,
e o coração me rasga atroz, imensa,
eu a bendigo na descrença em meio,
porque eu hoje só vivo da descrença.

À noute quando em funda soledade
minh'alma se recolhe tristemente,
pra iluminar-me a alma descontente,
se acende o círio triste da saudade.

E assim afeito às mágoas e ao tormento,
e à dor e ao sofrimento eterno afeito,
para dar vida à dor e ao sofrimento,

da saudade na campa enegrecida
guardo a lembrança que me sangra o peito,
mas que no entanto me alimenta a vida.

Augusto dos Anjos 

sábado, 14 de abril de 2018

DESFECHO


Olhando tantas vezes o Coyote
Se dá mal diante do Papa-léguas...
Hoje, no youtube, ele passou a régua,
E armou uma cilada, simples bote,

Sem dar mesmo nenhuma trégua,
Com aquela borrasca, aquele trote,
Que foi usado como se fosse mote,
E o Papa-léguas, com isto, foi à égua!

E ele pode, enfim, pegar sua presa,
E armado com seu garfo e faca à mesa,
Saboreou a tão desejada ceia.               

E por aqui se encerra essa peleja,
 A “grand finale” foi, por certo, a cereja
                                                     Do bolo para o tal Coyote, creia!

                                                                                        Miguel de Souza

sábado, 7 de abril de 2018

VOCÊ É INCRÍVEL

Foi você, Mãe querida, quem deu a luz
a mim, que vim ao mundo indefeso!
Por isso, minha Mãe, jamais meu desprezo!
Por isso, hoje sou eu quem a conduz.

Foi em você, Mãe humilde, que pus
minha boca faminta, sem peso!
Pude sugar o leite lícito e ileso,
e jamais ao seu ofício me opus.

Foi você, minha Mãe, quem me teve,
é por isso que todo filho deve
ser sempre o melhor filho possível.

Quantas vezes suguei seu seio farto!
Eu lhe agradeço pela dor do parto,
oh, Mãe querida, você é incrível!

Miguel de Souza
In: Poemais
P. 60

sexta-feira, 30 de março de 2018

TENTATIVA DE ANÁLISE DE UM POEMA

Prosódia

As folhas enchem de ff as vogais do vento.

                                           Mário Quintana

       
           Bem, em primeiro plano não encontrei os dois ff que segundo o poeta, enchem as vogais do vento, sendo que em folhas só há um f e em vento não há.
          As duas vogais de vento (e) e (o) perderiam o sentido se fossem enchidos ou preenchidos pelos ff que o poeta viu em folhas.
          A não ser que os ff signifiquem uma terceira palavra intrínseca no poema, que só o poeta poderia nos revelar. por exemplo: flores! aí ficaria assim: "As folhas enchem de flores as vogais do vento." Começaria a fazer sentido para mim. O segundo f apareceria, numa alusão, quem sabe, à primavera.
E por falar em primavera aí teremos três estações: folhas (outono), flores (primavera), vento (inverno), fora da ordem é claro.

sábado, 24 de março de 2018

LADAINHA

Por se tratar de uma ilha deram-lhe o nome de Ilha de Vera-Cruz.

Ilha cheia de graça
Ilha cheia de pássaros
Ilha cheia de luz.

Ilha verde onde havia
mulheres morenas e nuas
anhangás a sonhar com histórias de luas
e cantos bárbaros de pajés e poracés batendo os pés.

Depois mudaram-lhe o nome
pra Terra de Santa Cruz.
Terra cheia de graça
Terra cheia de pássaros
Terra cheia de luz.

A grande Terra girassol onde havia guerreiros de tanga.
E onças ruivas deitadas à sombra das árvores mosqueadas de sol.

Mas como houvesse, em abundância,
certa madeira de sangue cor de brasa
e como o fogo da manhã selvagem
fosse um brasido no carvão noturno da paisagem,
e como a Terra fosse de árvores vermelhas
e se houvesse mostrado assaz gentil,
deram-lhe o nome de Brasil.

Brasil cheio de graça
Brasil cheio de pássaros
Brasil cheio de luz.


Cassiano Ricardo
In. MartimCererê
P. 50

domingo, 18 de março de 2018

SÃO JOSÉ


São José, pai adotivo de Jesus,
Era esse dedicado carpinteiro,
Que na carpintaria, o dia inteiro
Trabalhava... Pois essa era sua cruz!
                  
E, nesse exemplo, São José traduz
Como operário fiel, prazenteiro,
Desde o mais simples, pobre faxineiro,   
Ao mais nobre operário que conduz

Nos ombros o progresso da nação!
Recorro-vos a vós em oração,
Oh, meu glorioso, fiel São José...

Conceda-me essa paz que busco tanto,
E transformai-me, após a morte, em santo,
Através da perseverança, fé!

                                                                Miguel de Souza

quarta-feira, 14 de março de 2018

INTERAÇÃO


RUA DA MINHA INFÂNCIA

Relembro a rua da minha infância,
Sempre sortida desses curumins,
Qual madeira apinhada de cupins...
Cena longínqua a se perder à distância!...

Onde essa vida, sem nenhuma ânsia,
Passava vera sob os nossos patins...
Quais copos a esbarrar-se em tintins,
Hoje, celebro aquela abundância!

A rua enfileirada de moleques,
O meu irmão quase sempre de pileque,
Foi a cena que marcou essa meninice!

Hoje, olho para tudo com riqueza,
Porque Deus me ofertou esta proeza de
dizer em versos o que ninguém disse!

Miguel de Souza



RUAS DA INFÂNCIA

Ruas da infância, casas conjugadas,
Com seu dolente som de realejo,
Ainda escuto o seu velho arpejo,
Pelas cadeiras postas nas calçadas.

Casas tão juntas quase irmanadas,
Vindas dos sonhos que ainda vejo,
Com as fachadas plenas de azulejos,
Como vivessem assim com as mãos dadas.

Os paralelepípedos expostos,
Mosaicos bem juntinhos, justapostos,
Se contados somam-se um a um.

Rua de coisas somente pra contar,
Ou esconder às vezes do falar,
Rua de todos nós ou de nenhum.

Fernando Cunha Lima


sábado, 10 de março de 2018

MOTE E GLOSA

Mote:

minha maleta é um saco,
meu cadeado é um nó.


Glosas:

Minha cidade é Manaus,
meu estado é Amazonas;
minha cantora é Madonna,
meu clima é quarenta graus;
meu naipe é dez de paus,
minha arma é uma enxó,
minha ave é um socó,
que na retina eu emplaco.
            Minha maleta é um saco,
            meu cadeado é um nó.

                       -xx-

O meu país é o Brasil,
meu time é o Flamengo;
um lugar : Realengo,
meu cartunista é o Henfil;
meu pássaro é o Tiziu,
meu ritmo é o Forró
e meu ditado é: "Que só!"
"ulha já!", "Tu é leso, é!", "É o fraco!".
         Minha maleta é um saco,
         meu cadeado é um nó.

Miguel de Souza

quarta-feira, 7 de março de 2018

A PRESENÇA DA MULHER


Assim qual todo poeta um dia canta,
Também venho cantar a presença                           
Da mulher, e essa atitude imensa
De gerar. Sendo comparada à Santa!

Para ela, hoje, este canto se levanta    
Em louvor ao oito de março, que a imprensa
Faz com que a sociedade repense a
Condição dela em tudo que a suplanta!

Mas, não olhamos para ela só neste dia,
Vamos obedecer esta poesia,
E pensar na mulher o ano todo!

Dando carinho, amor, muita ternura...
Pois este ser divino com candura,
Merece ser tratada deste modo!

Miguel de Souza

sábado, 3 de março de 2018

ONDA QUE, ENROLADA,TORNAS

Onda que, enrolada, tornas,
Pequena, ao mar que te trouxe
E ao recuar te transtornas
Como se o mar nada fosse,

Por que é que levas contigo
Só a tua cessação,
E, ao voltar ao mar antigo,
Não levas meu coração?

Há tanto tempo que o tenho
Que me pesa de o sentir.
Leva-o no som sem tamanho
Com que te ouço fugir!

Fernando Pessoa
In: Mensagem
P.101


SEGREDO DO VENTO

Oh, onda que o vento trouxe!
Trouxe pra junto da beira,
e, ao voltar, como se fosse,
qualquer coisa meio sem eira.

Por que não trazes contigo,
Oh, vento?! A onda de ontem?
Teu segredo mais antigo,
peça a alguém que conte.

Há tanto tempo que venho
em busca desse segredo,
que dele já não mais tenho,
nenhuma forma de medo!

Miguel de Souza

sábado, 24 de fevereiro de 2018

MANIPULAÇÃO

Entro em cena mais uma vez de novo,
Neste palco sublime: a própria vida.
Pra desferir um golpe na ferida,
Desses que pensam como pensa o povo!

Eu sei que, com isso, sequer comovo...
Não vou mudar a tal sina inserida,
Sei lá por quem! Por u’a pessoa atrevida,
Que tem, pra sempre, o meu desaprovo.

Já chega! Basta dona rede globo!
O povo está deixando de ser bobo.
Você perdeu essa guerra pra internet!    

Google, twitter, face book, youtube…
Temos, agora, outra juventude
Que mudar esta história promete

                                                        Miguel de Souza

sábado, 17 de fevereiro de 2018

SONETO SEM NOME

Das poucas lembranças que tenho da minha meninice interiorana, era da época da enchente. Mas provavelmente, o término desta. Lembro-me que atrás de casa formava uma espécie de igarapé que, com a chegada da seca ia se desfazendo. Era sempre poético poder pisar e andar de novo na terra que havia sido consumida pela água.
Era aí que se dava uma das mais belas imagens que vislumbrava e que o tempo não se encarregou de apagar da minha retina. As tartaruguinhas recém- -nascidas caminhavam em direção ao rio. Na luta pela vida, muitas delas feneciam no caminho.
Foi quando tive a ideia de pegar uma para criar, juntamente com minhas duas irmãs, que infelizmente adoeceram, e eu tive de cuidar dela sozinho. Teria que trocar a água do recipiente de quando em vez, colher e colocar certa gramínea para ela se alimentar. Coisa que não foi feita. Pois, só queria tirar a tartaruguinha da bacia para brincar com ela, e me esquecia de trocar a sua água e de colocar o seu alimento. Quando minhas irmãs perguntavam sobre ela, respondia que estava tudo bem. Não demorou muito e a tartaruguinha morreu de fome e maus tratos.
Para me redimir desta falha, escrevi um soneto sem título. Pois o arrependimento foi tanto, que não consegui intitular o soneto que compus, pedindo desculpa dela pela minha inocência de garoto.


Venho neste soneto com vergonha,
Pedir desculpas a uma tartaruga!
Por eu ter impedido a sua fuga,
Numa atitude vil, cruel, errônea...

Pela minha ação tanto quanto bisonha, 
Que o meu pensamento, hoje, aluga
As lágrimas que o tempo não enxuga...
Hoje, essa tartaruga apenas sonha.

Com o meu peito cheio de mágoa,
Por eu não ter trocado a sua água,
Rabisco esse soneto sem nome.

E peço-te desculpas mais uma vez,
Se fosse hoje em dia, talvez,
Não a deixaria perecer de fome.

Miguel de Souza