Um dia desses, ao assistir o telejornal do Sbt, o "Sbt Brasil"; jornal esse que surpreende pela opinião dada sempre com bom senso pelos seus âncoras: Raquel Sherazade e Joseval Peixoto, nessa falsa democracia em que vivemos. O jornalista Joseval Peixoto deu a notícia de dois garotos que mergulhavam nas águas imundas de um igarapé, catando latinhas para o sustento de suas respectivas famílias.
A grande surpresa veio quando o jornalista citou, lá pelas tantas, um fragmento do poema "EVOCAÇÃO DO RECIFE" do sempre genial Manuel Bandeira. E não parou por aí! Terminou a notícia com a leitura do poema "O BICHO", também do poeta Manuel Bandeira. Tal atitude do jornalista me fez refletir um pouco nessa questão da poesia, e me levou a outro gigante das letras, o poeta Aníbal Beça que havia escrito um soneto com o título: "PARA QUE SERVE A POESIA?" Mas, enfim, para que serve a poesia?
Pessoas catando algo nos lixos é uma cena cada vez mais corriqueira, principalmente nos grandes centros. O poema do Bandeira foi escrito nos idos de 1940 do século passado, e já estamos em 2013, se passaram mais de 70 anos e essa cena continua a se repetir. Ainda encontramos pessoas nas lixeiras, catando algo entre os detritos, como bem nos informa o poema. Mas e aí, com quem está a falha?
A poesia não soluciona, não resolve. É uma afirmação dura para os amantes dela. Mas é de fundamental importância para que as coisas se resolvam. Eles (os políticos) não a levam a sério, e poesia é coisa séria! É ela, a poesia, quem aponta, indica, coloca o dedo na ferida, é uma seta a dizer que algo não está correndo bem. O poeta vem dando sua parcela de contribuição no correr dos anos. Cabe àqueles que regem as leis no mundo, olharem com um pouco mais de zelo, e cumprirem a sua parte.
O BICHO
Vi ontem um bicho,
na imundície do pátio,
catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
não examinava, nem cheirava:
engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
não era um gato,
não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
Manuel Bandeira
PARA QUE SERVE A POESIA?
De servir-se utensílio dia a dia
utilidade prática aplicada,
o nada sobre o nada anula o nada
por desvendar mistério na magia.
O sonho em fantasia iluminada
aqui se oferta em módica quantia
por camelôs de palavras aladas
marreteiros de mansa mercancia.
De pagamento, apenas um sorriso
de nuvens, uma fatia de grama
de orvalho, e o fugaz fulgor de astro arisco.
Serena sentença em sina servida,
seu valor se aquilata e se esparrama
na livre chama acesa de quem ama.
Aníbal Beça
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