domingo, 29 de junho de 2014

A LIÇÃO DOS GANSOS

         
          Quando um ganso bate as asas, cria um vácuo para o pássaro seguinte. Voando numa formação em "V", o bando inteiro tem seu desempenho 71% melhor do que se a ave voasse sozinha.
          Sempre que um ganso sai da formação, sente subitamente a resistência por tentar voar sozinho e, rapidamente, volta para a formação, aproveitando a "aspiração" da ave imediatamente à sua frente.
          Quando o ganso líder se cansa, muda para trás na formação e, imediatamente outro ganso assume o lugar, voando para a posição de ponta.
          Os gansos de trás, na formação, grasnam para incentivar e encorajar os da frente a aumentar a velocidade.
          Quando um ganso fica doente, ferido, ou é abatido, dois gansos saem da formação e seguem-no para ajudá-lo e protegê-lo. Ficam com ele até que ele esteja apto a voar de novo ou morra. Só assim, eles voltam ao procedimento normal, com outra formação, ou vão atrás de outro bando.


OS GANSOS

Voa o ganso-líder formando um vácuo
Para os outros que vêm em seguida...
E, nesse grande exemplo de vida,
Voam em V, mas parecendo em arco.

E quando o ganso-líder sentir-se árduo,
Outro que voa atrás assume a lida!
E vão grasnando, incentivando-o na ida,
Até o mesmo sentir-se tanto fátuo!

Se um ganso, por acaso, na viagem,
Sentir-se fraco àquela paragem,
E agonizar na lida, o pobre ganso!

Dois gansos saem para protegê-lo,
Para ajudá-lo e, enfim, poder mantê-lo,
Na mesma direção, fiel e manso!

                       Miguel de Souza

terça-feira, 17 de junho de 2014

SOBRE POEMAS


                                                                        GADI


                                                                      POEMAS

                                                                      Poemas que não foram lidos
                                                                      Poemas que foram esquecidos
                                                                      poemas rabiscados
                                                                      Rasgados
                                                                      Dilacerados
                                                                      Perdidos
                                                                      Poemas... de uma noite sem fim
                                                                      Que falam de uma vida não vivida
                                                                      Que trago dentro de mim.

                                                                                                                     Gadi
                         

ANÁLISE

          Este poema aborda a questão do próprio poema antes da escrita, é algo que não chegou a acontecer, e que foi descartado pelo poeta antes de sua concretização. Trata-se, portanto, de metapoema, porque o poeta está se referindo ao próprio poema em seus versos. Lembrou-me de relance o poema "Emergência" de Mário Quintana, não só pelo tamanho dos textos, mas pela temática proposta pelos poetas. Enquanto Quintana se refere ao poema feito. Gadi fala do poema que está por ser escrito ainda. Por isso, há certo diálogo entre ambos.
          O poeta é sintético, elabora seu texto com palavras que, ao que me parece, passaram por uma bateia, antes de irem deitar-se na superfície do poema. Palavras como: "esquecidos", "rabiscados", "rasgados", "dilacerados", "perdidos", dentro do texto viraram sinônimas, dando assim nuances de grandiosidade dentro de sua construção. A concisão do poema encaixa o mesmo dentro das características minimalistas. É o dizer muito com poucas palavras.
          O poeta inicia seu texto fazendo uso das figuras de sintaxe ou de construção como a anáfora, por exemplo, que consiste na repetição intencional de termos ou expressõe no início dos versos de um poema. Vide: POEMAS que não foram lidos/ POEMAS que  foram esquecidos/ POEMAS rabiscados [...]. E, há também, em seguida outra figura de construção, a zeugma que é a omissão de um termo citado anteriormente, pois sua repetição seria desnecessária. POEMAS rabiscados/rasgados/dilacerados/perdidos [...].
          No plano fônico do poema, temos aí um casamento perfeito entre a ideia do tema proposto e a mensagem do texto, já que palavras como: "poemas", "não", "foram", "lidos", "esquecidos", "noite", "fim", "vida", "vivida", "dentro", "mim", se antepõem a: ""rabiscados", "rasgados", "dilacerados", "trago". Aquelas, por serem palavras com vogais fechadas, dando um tom funesto ao texto. E estas por traduzirem alegria, ao terem as vogais abertas. isto encerra um misto de alegria e tristeza que muito contribui para a qualidade do poema.
          Este poema desse "garoto prodígio" que é o Gadi, tem tudo a ver com a época atual que vivemos na literatura, pois o texto é construído com apenas nove versos, e se encaixa bem naquela poesia que Oswald de Andrade nos apresenta no seu "Primeiro Caderno de Poesia do Aluno Oswad de Andrade". E que eu chamaria também de poema Oswaldiano. Nada mais justo.
          Os três últimos versos do poema: "poemas... de uma noite sem fim/ que falam de uma vida não vivida/ que trago dentro de mim", é o desfecho da mensagem. Aquilo que no soneto chama-se chave-de-ouro. O poeta faz uso da antítese para a mensagem do texto. Ora, sabemos que para escrever, o poeta traz no corpo do texto a verdade, pois poesia tem compromisso com a verdade, é a vivência do poeta ante a vida. Até por isso, o poema não acontece, pois o texto fala de uma vida não vivida.