sábado, 25 de fevereiro de 2017

A BRUXA

Nesta cidade do Rio
De dois milhões de habitantes
Estou sozinho no quarto
Estou sozinho na América.

Estarei mesmo sozinho?
Ainda há pouco um ruído
Anunciou vida a meu lado.
Certo não é vida humana,
Mas é vida. E sinto a Bruxa
Presa na zona de luz.

De dois milhões de habitantes!
E nem precisava tanto...
Precisava de um amigo,
Desses calados, distantes,
Que lêem verso de Horácio
Mas secretamente influem
Na vida, no amor, na carne.
Estou só, não tenho amigo,
E a essa hora tardia
Como procurar amigo?

E nem precisava tanto.
Precisava de mulher
Que entrasse nesse minuto.
Recebesse esse carinho
Salvasse do aniquilamento
Um minuto e um carinho loucos
Que tenho para oferecer.

Em dois milhões de habitantes
Quantas mulheres prováveis
Interrogam-se no espelho
Medindo o tempo perdido
Até que venha a manhã
Trazer leite, jornal, calma.
Porém a essa hora vazia
Como descobrir mulher?

Esta cidade do Rio!
Tenho tanta palavra meiga,
Conheço vozes de bichos,
Sei os beijos mais violentos,
Viajei, briguei, aprendi.
Estou cercado de olhos,
De mãos, afetos, procuras.

Mas tento comunicar-me,
O que há é apenas a noite
E uma espantosa solidão.
Companheiros, escutai-me!
Essa presença agitada
Querendo romper a noite
Não é simplesmente a Bruxa.
É antes a confindência
Exalando-se de um homem.

Carlos Drummond de Andrade

sábado, 18 de fevereiro de 2017

O SANTO QUE BAIXOU NO TERREIRO

O Santo que baixou
no terreiro
incorporado no
"cavalo"
Trouxe a todos
um abalo
e ao "sacaca"
primeiro,

O Santo que baixou
no terreiro...

O Santo que baixou
no terreiro
tirou um ponto
bonito falando de Paz
e Amor
e que depois da
dor
é a vez do
infinito,

O Santo que baixou
no terreiro...

O Santo que baixou
no terreiro
usou um "pito" pro
defume
descarregou os seus
médiuns
(Com o melhor dos
remédios)
Pediu força, às mentes
lume,

O Santo que baixou
no terreiro...

O Santo que baixou
no terreiro
Saravou todos
os filhos
despediu-se do
congar
e retornou a
Oxalá!

O Santo que baixou
no terreiro.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

CURIOSIDADE LITERÁRIA

Em agosto entrei numa lanchonete para merendar. Lá pelas tantas, se aproxima uma moça, perguntando qual a minha religião. Sou católico, respondi à moça. Pediu-me uma ajuda para a sua igreja, e me ofereceu um escapulário e uma imagem de um Santo por R$ 2,00. Coloquei a mão no bolso e, como não tinha dinheiro trocado, entreguei a ela R$ 10,00, esperando evidentemente, R$ 8,00 de volta. Ela avançou sobre a nota de R$ 10,00 como um faminto avança sobre um prato de comida. Estranhei aquele comportamento. - Espera aí disse a moça, que vou ali trocar o dinheiro e trazer o restante. Assim que ela saiu, o atendente da lanchonete disse: - ela não volta mais, você caiu no golpe! - Se ela me enganou, problema dela, respondi ao atendente meio sem jeito. Ao pagar a merenda para a caixa, que já me conhecia, pois não é de hoje que freqüento a lanchonete, ela me disse: - eu trabalho aqui há 20 anos, não são 20 dias, eu sei distinguir todo tipo de pessoas que entram aqui, se você quiser praticar a caridade a alguém, reserve um pouco do seu dinheiro para os idosos que estão desassistidos nos asilos, para os doentes esquecidos nos hospitais, para as crianças que estão nas casas de misericórdias, enfim... Tomei isto como lição. Mais tarde, escrevi o soneto abaixo, talvez para desabafar, não sei, enfim, eis o soneto:


SONETO BRUSCO
                                        A uma golpista

Coitado de quem tenta, num engodo,
Enganar o outro ardilosamente,
Com astúcia, com artimanha, crente
De que... E sair de cena com apodo

De golpista, a viver metido em lodo!
Coitado de quem, para enganar, mente,
Usando de má fé com toda a gente,
E que com isto, vai me ferrar todo.

Coitada dessa gente desonesta,
Que veio ao mundo atrapalhar a festa,
E que não sabe nem viver a vida.

Coitada de quem se acha sempre esperta,
De quem pensa que dessa forma acerta,
Mas está enganando-se a si, querida!

Miguel de Souza
        

  

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

PINGUE-PONGUE

Nas fábricas por onde trabalhei, depois do almoço há aquilo que já se tornou praxe, a famosa hora da sesta. Mas há também aqueles que ignoram a sesta e preferem se aventurar como verdadeiros esportistas. Pimbolim, sinuca, pingue-pongue... enfim, os mais variados jogos são apresentados nessa mirrada hora. Também me aventurava nesse entretenimento vez ou outra, foi aí que me transformei não num extraordinário jogador de pingue-pongue, mas pelo menos, num sujeito bem competitivo. E o resultado disso é um poema em que, na sua estrutura, tento imitar um jogo de pingue-pongue. Observe:



Pingue
                               Pongue
Pingue
                               Pongue

É o som da bolinha frágil
Quando bate na raquete!

                                Pingue
Pongue
                                Pingue
Pongue

É o que faz a bolinha ágil
Neste jogo em que se compete!


Miguel de Souza 

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

SOB O VÉU DA AMIZADE

A Rosa
                                               Para Rosa Helena
Tu és, no jardim da vida, a
Rosa das rosas de fato!
De sorriso franco e lato,
todo dia nessa lida!
Tu és a Rosa que não finda,
a que não se despetala,
e do teu âmago, ainda, 
um suave perfume exalas!
Tu és a nossa Rosa imóvel,
a balançar pernas, braços...
Avessa a todos os ócios,
na paisagem dos espaços.
            Tu és a Rosa mais querida, a
            florir no jardim da vida!

Miguel de Souza