Das poucas lembranças
que tenho da minha meninice interiorana, era da época da enchente. Mas
provavelmente, o término desta. Lembro-me que atrás de casa formava uma espécie
de igarapé que, com a chegada da seca ia se desfazendo. Era sempre poético
poder pisar e andar de novo na terra que havia sido consumida pela água.
Era aí que se dava
uma das mais belas imagens que vislumbrava e que o tempo não se encarregou de
apagar da minha retina. As tartaruguinhas recém- -nascidas caminhavam em
direção ao rio. Na luta pela vida, muitas delas feneciam no caminho.
Foi quando tive a
ideia de pegar uma para criar, juntamente com minhas duas irmãs, que
infelizmente adoeceram, e eu tive de cuidar dela sozinho. Teria que trocar a
água do recipiente de quando em vez, colher e colocar certa gramínea para ela
se alimentar. Coisa que não foi feita. Pois, só queria tirar a tartaruguinha da
bacia para brincar com ela, e me esquecia de trocar a sua água e de colocar o
seu alimento. Quando minhas irmãs perguntavam sobre ela, respondia que estava
tudo bem. Não demorou muito e a tartaruguinha morreu de fome e maus tratos.
Para me redimir desta
falha, escrevi um soneto sem título. Pois o arrependimento foi tanto, que não
consegui intitular o soneto que compus, pedindo desculpa dela pela minha
inocência de garoto.
Venho neste soneto
com vergonha,
Pedir desculpas a uma
tartaruga!
Por eu ter impedido a
sua fuga,
Numa atitude vil,
cruel, errônea...
Pela minha ação tanto
quanto bisonha,
Que o meu pensamento,
hoje, aluga
As lágrimas que o
tempo não enxuga...
Hoje, essa tartaruga
apenas sonha.
Com o meu peito cheio
de mágoa,
Por eu não ter
trocado a sua água,
Rabisco esse soneto
sem nome.
E peço-te desculpas
mais uma vez,
Se fosse hoje em dia,
talvez,
Não a deixaria
perecer de fome.
Miguel de Souza
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