Um poeta existe para fazer o povo pensar, refletir. E João Henriques da Silva tem plena consciência disso. Num dos sonetos mais extraodinários que já li sobre o NATAL, ele retrata com muita sapiência o comportamento do povo ante a essa data tão importante.
NOITE DE NATAL
O palacete em festa!... Noite de Natal!...
As vidas, esquecendo a verdadeira vida,
abusam tanto da comida e da bebida
que mais parece um animado carnaval.
Passam horas!... Do amor fraterno nem sinal!...
No casebre ao lado, entre roupas encardidas,
pobre vida vai dando vida a outra vida.
No palacete, continua o festival.
O amor ao próximo dali passa distante.
Ninguém se lembra do aniversariante
que veio ao mundo para combater o mal.
Lá no casebre, surge a luz resplandecente,
pois é ali em que Jesus está presente...
No palacete, certamente, o seu rival.
João Henriques da Silva
In: Antologia Del'Secchi, volume XI
P. 201
quarta-feira, 24 de dezembro de 2014
sexta-feira, 19 de dezembro de 2014
TODO POVO TEM O GOVERNO QUE MERECE
Quem por ventura for ao centro da cidade, e saltar na Estação da Matriz, estará colocando a sua vida em risco. Porque terá que dividir espaço com os ônibus, para ter acesso ao centro comercial. Pois cercaram a praça e não se preocuparam, ao menos, em improvisar uma passarela para os pedestres trafegarem com segurança. E o que é pior, não se vê movimentação de homens trabalhando na área.
É uma bela resposta do prefeito ao povo que o elegeu. E ninguém fala nada! E fica por isso mesmo! Enquanto Manaus vive um de seus mandatos mais pífios da história, o prefeito vem à baila se queixar de perseguição pelo Governo Federal. "Tadinho dele," é inocente esse sujeito!
Para quem passou oito anos de senado atrapalhando o desenvolvimento deste país, pensando em interesses partidários, e querendo ferrar com o então Presidente Luiz Inácio "Lula" da Silva, o prefeito vem agora posar de perseguido e se queixar de falta de incentivos para governar Manaus. Ora meu caro, conta outra que essa não cola!
Governa esta cidade um prefeito
Repleto de arrogância e covardia
Com os olhos voltados à burguesia
Revestido de cólera e preconceito.
Vai governando pífio desse jeito
O tal prefeito, da injustiça, cria
Em afanar a fé do povo se fia
Com as loas, falácias nesses pleitos.
Pensando muito mais no seu bolso
Com o povo no fundo do calabouço, e
Cada vez mais a populaça desce...
Pois é como diria Rui Barbosa
nessas palavras maravilhosas:
Todo povo tem o governo que merece!
Miguel de Souza
domingo, 14 de dezembro de 2014
15 DE DEZEMBRO - DIA DO JARDINEIRO
ESSAS MÃOS
"Tinha mãos de jardineiro
Quando tratava de amor"
Chico Buarque
Das suas mãos brotam flores
para embelezar o espaço
perfumar o tempo
colorir o mundo
Das suas singelas mãos
ricas em calejos
pobres de afagos
mas nobres na labuta
Surge o aconchego dos pássaros
seus cantos maviosos
em sinal de agradecimento
a essas mãos dignas
que tecem apenas o simples trabalho
pelo pão de cada dia.
Miguel de Souza
segunda-feira, 8 de dezembro de 2014
NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO
Toda vez que, ao passar defronte à praça,
contemplo aquela imagem sempre linda,
da Santa envolta em luz, na berlinda...
a abençoar, quem por ali, sempre passa.
A Vossa imagem cheia de brilho, graça;
há de continuar pra todo o sempre ainda,
abençoando de maneira infinda,
essa gente, esse povo e toda essa raça!
Toda vez que, ao passar no 609,
a imagem dessa Santa me comove,
e contemplo-a com fé e devoção...
Porque sei que também sou abençoado,
e que Jesus atende ao Vosso rogado, oh,
Virgem Senhora da Conceição.
Miguel de Souza
domingo, 7 de dezembro de 2014
FLORBELA ESPANCA
Em oito de dezembro de 1894. Alta madrugada. Nasce em Vila Viçosa (Alentejo), na rua Angerino, Florbela d'Alma da Conceição Espanca. Sonetista excelente, Florbela Espanca expressa suas emoções em linguagem telúrica, de imagens fortes, impregnadas de verdade física e arrebatamento.
Poetisa de um lirismo fortemente marcado por sua terra, pôs em versos, de aparência parnasiana, o erotismo e a liberdade que expressou e assumiu pioneiramente na obra como na vida.
Não usava máscara diante dos problemas da vida, nem subterfúgio ao expressá-los em seus autênticos sonetos.
Obras:
Livro de Mágoas (1919),
Livro Soror Saudade (1923),
Charneca em Flor (1930) e
Reliquiae (1931)
Na passagem de 7 para 8 de dezembro de 1930 -ritualisticamente no dia de seu aniversário- Florbela d'Alma da Conceição Espanca suicida-se em Matosinhos, ingerindo uma dose excessiva de Veronal. Algumas décadas depois, em maio de 1964, seus restos mortais são transportados para Vila Viçosa.
MAGNITUDE
Para Florbela Espanca
Solidarizo-me com os teus versos
Oh, magnânima poeta portuguesa
Tu que cantaste a tua natureza
e, espalhaste por todo esse universo
Teus sonetos tão cheios de beleza
e, ao mesmo tempo, tão contraversos
que a quedar-me estaticamente imerso
chego, por todo esse talento, com certeza!
Poeta triste, e de feição tão amena
que comovia a todos! E serena
por traduzir ao mundo tal lirismo.
Qual este ser que não se comove
ao ler: "Livro de Mágoas" de 1919
e no livro seguinte: "Fanatismo".
Miguel de Souza
quarta-feira, 3 de dezembro de 2014
poemicros
sou
sol
do
sol
do
sol
da
do
na valsa
da vida!
sou salsa.
duvida?
tem dias em que
tudo-
-nada
deságua em mim...
dulçor,
dúctil!...
fútil
amor!
miguel de souza
sol
do
sol
do
sol
da
do
na valsa
da vida!
sou salsa.
duvida?
tem dias em que
tudo-
-nada
deságua em mim...
dulçor,
dúctil!...
fútil
amor!
miguel de souza
domingo, 30 de novembro de 2014
JOÃO PAULO II -1920/2005
Tocamos aqui um ponto essencial.
Quem tiver notado em si mesmo esta
espécie de centelha divina que é a
vocação artística - de poeta,
escritor, pintor, escultor, arquiteto,
músico, ator... -, adverte ao mesmo
tempo a obrigação de não
desperdiçar este talento, mas de o
desenvolver para colocá-lo ao
serviço do próximo e de toda a
humanidade - João Paulo II.
Quem tiver notado em si mesmo esta
espécie de centelha divina que é a
vocação artística - de poeta,
escritor, pintor, escultor, arquiteto,
músico, ator... -, adverte ao mesmo
tempo a obrigação de não
desperdiçar este talento, mas de o
desenvolver para colocá-lo ao
serviço do próximo e de toda a
humanidade - João Paulo II.
sexta-feira, 28 de novembro de 2014
CURIOSIDADE LITERÁRIA
MARIANA TELES
A talentosa poetisa Mariana Teles e um soneto escrito no verso de uma prova em que o professor a desafiou a tirar boa nota.
Não vai ser papel que vai provar,
Nem medir competência de ninguém;
Quem acerta é sujeito a errar também,
Que na vida nem tudo é acertar.
Teu diploma não vem pra ocultar,
Os padrões da missão que te convém:
Que é plantar o saber, pregar o bem,
Sem certeza que o futuro irá vingar.
Eu não sei se na tua faculdade,
Algum mestre te ensinou que humildade,
É princípio de toda profissão...
Me perdoe professor, o atrevimento,
Mas não troco o meu conhecimento,
Por esse anel que enfeita tua mão!
De: Mariana Teles
Do livro: O Rio Que Não Passa
A talentosa poetisa Mariana Teles e um soneto escrito no verso de uma prova em que o professor a desafiou a tirar boa nota.
Não vai ser papel que vai provar,
Nem medir competência de ninguém;
Quem acerta é sujeito a errar também,
Que na vida nem tudo é acertar.
Teu diploma não vem pra ocultar,
Os padrões da missão que te convém:
Que é plantar o saber, pregar o bem,
Sem certeza que o futuro irá vingar.
Eu não sei se na tua faculdade,
Algum mestre te ensinou que humildade,
É princípio de toda profissão...
Me perdoe professor, o atrevimento,
Mas não troco o meu conhecimento,
Por esse anel que enfeita tua mão!
De: Mariana Teles
Do livro: O Rio Que Não Passa
domingo, 16 de novembro de 2014
O ANOITECER DE QUEM AMANHECIA
MANOEL DE BARROS
Nascido em Cuiabá em 1916, Manoel de Barros estreiou em 1937 com o livro "Poemas Concebido sem Pecado". Sua obra mais conhecida é o "Livro sobre Nada", publicado em 1996. Cronologicamente vinculado à geração de 45, mas formalmente ao Modernismo brasileiro, Manoel de Barros criou um universo próprio - Subvertendo a sintaxe e criando construções que não respeitam as normas da língua padrão -, marcado, sobretudo, por neologismos e sisnetesias, sendo, inclusive, comparado a Guimarães Rosa.
Em 1986, o poeta Carlos Drummond de Andrade declarou que Manoel de Barros era o maior poeta brasileiro vivo. Antônio Houaiss, um dos mais importantes filólogos e críticos brasileiros escreveu: "A poesia de Manoel de Barros é de uma enorme racionalidade. Suas visões, oníricas num primeiro instante, logo se revelam muito reais, sem fugir a um substrato ético muito profundo. Tenho por sua obra a mais alta admiração e muito amor".
"Poesia é voar fora da asa".
MUNDO PEQUENO
O mundo meu é pequeno, Senhor.
Tem um rio e um pouco de árvores.
Nossa casa foi feita de costas para o rio.
Formigas recortam roseiras da avó.
No fundo do quintal há um menino e suas latas
maravilhosas.
Todas as coisas deste lugar já estão comprometidas
com aves.
Aqui, se o horizonte enrusbece um pouco, os
besouros pensam que estão no incêndio.
Quando o rio está começando um peixe,
Ele me coisa
Ele me rã
Ele me árvore.
De tarde um velho tocará sua flauta para inverter
os ocasos.
Manoel de Barros
Do livro "O Livro das ignrãças"
"O poeta é um ente que lambe palavras"
II
Conheço de palma os dementes de rio.
Fui amigo de Bugre Felisdônio, de Ignácio Rayzama
e de Rogaciano.
Todos catavam pregos na beira do rio para enfiar
no horizonte.
Um dia encontrei Felisdônio comendo papel nas ruas
de Corumbá.
Me disse que as coisas que não existem são mais
bonitas.
VII
Toda vez que encontro uma parede
ela me entrega às suas lesmas.
Não sei se isso é uma repetição de mim ou das
lesmas.
Não sei se isso é uma repetição das paredes ou
de mim.
Estarei incluído nas lesmas ou nas paredes?
Parece que lesmas só é uma divulgação de mim.
Penso que dentro de minha casca
não tem um bicho:
Tem um silêncio feroz.
Estico a timidez da minha lesma até gozar na pedra.
FABRICANTE DE SONHOS
Pro Manoel de Barros
Viajor incessante de infâncias,
chegaste incólume ao teu quinto porto.
Praticante de pecados solitários,
no preâmbulo da tua vida!
Agora sim, posso dizer-te árvore,
ou água, ou fonte...
Tu que voaste fora da asa tantas vezes,
e, tantas vezes, pousaste em terreno árido.
E cultivaste, e adubaste, e plantaste palavras novas
em terras que ninguém anda,
para a inversão do teu apanágio.
Oh, eterno fabricante de sonhos.
Miguel de Souza
Nascido em Cuiabá em 1916, Manoel de Barros estreiou em 1937 com o livro "Poemas Concebido sem Pecado". Sua obra mais conhecida é o "Livro sobre Nada", publicado em 1996. Cronologicamente vinculado à geração de 45, mas formalmente ao Modernismo brasileiro, Manoel de Barros criou um universo próprio - Subvertendo a sintaxe e criando construções que não respeitam as normas da língua padrão -, marcado, sobretudo, por neologismos e sisnetesias, sendo, inclusive, comparado a Guimarães Rosa.
Em 1986, o poeta Carlos Drummond de Andrade declarou que Manoel de Barros era o maior poeta brasileiro vivo. Antônio Houaiss, um dos mais importantes filólogos e críticos brasileiros escreveu: "A poesia de Manoel de Barros é de uma enorme racionalidade. Suas visões, oníricas num primeiro instante, logo se revelam muito reais, sem fugir a um substrato ético muito profundo. Tenho por sua obra a mais alta admiração e muito amor".
"Poesia é voar fora da asa".
MUNDO PEQUENO
O mundo meu é pequeno, Senhor.
Tem um rio e um pouco de árvores.
Nossa casa foi feita de costas para o rio.
Formigas recortam roseiras da avó.
No fundo do quintal há um menino e suas latas
maravilhosas.
Todas as coisas deste lugar já estão comprometidas
com aves.
Aqui, se o horizonte enrusbece um pouco, os
besouros pensam que estão no incêndio.
Quando o rio está começando um peixe,
Ele me coisa
Ele me rã
Ele me árvore.
De tarde um velho tocará sua flauta para inverter
os ocasos.
Manoel de Barros
Do livro "O Livro das ignrãças"
"O poeta é um ente que lambe palavras"
II
Conheço de palma os dementes de rio.
Fui amigo de Bugre Felisdônio, de Ignácio Rayzama
e de Rogaciano.
Todos catavam pregos na beira do rio para enfiar
no horizonte.
Um dia encontrei Felisdônio comendo papel nas ruas
de Corumbá.
Me disse que as coisas que não existem são mais
bonitas.
VII
Toda vez que encontro uma parede
ela me entrega às suas lesmas.
Não sei se isso é uma repetição de mim ou das
lesmas.
Não sei se isso é uma repetição das paredes ou
de mim.
Estarei incluído nas lesmas ou nas paredes?
Parece que lesmas só é uma divulgação de mim.
Penso que dentro de minha casca
não tem um bicho:
Tem um silêncio feroz.
Estico a timidez da minha lesma até gozar na pedra.
FABRICANTE DE SONHOS
Pro Manoel de Barros
Viajor incessante de infâncias,
chegaste incólume ao teu quinto porto.
Praticante de pecados solitários,
no preâmbulo da tua vida!
Agora sim, posso dizer-te árvore,
ou água, ou fonte...
Tu que voaste fora da asa tantas vezes,
e, tantas vezes, pousaste em terreno árido.
E cultivaste, e adubaste, e plantaste palavras novas
em terras que ninguém anda,
para a inversão do teu apanágio.
Oh, eterno fabricante de sonhos.
Miguel de Souza
domingo, 2 de novembro de 2014
SONETO INGLÊS EM REDONDILHA MAIOR
REGRA
Quando eu subir no mais alto
degrau dessa escada frágil...
E perceber que o tempo ágil,
lânguido, tomar de assalto,
a minha hora vã, terrena.
E, ainda há chance sim,
pois a regra é mesmo assim,
vencida a duras penas!
E, na outra parte do jogo, o
segundo tempo da partida,
a outra metade da vida,
em que caberá o meu rogo?
Não sei. Apenas cumpro a regra
de tudo que se desintegra.
Miguel de Souza
sexta-feira, 24 de outubro de 2014
SOBRE LIVROS
Leitura finda de: "MARARI, A PRINCESINHA DOS MANAUS", de Albertina Costa Rego de Albuquerque que tive a honra de conhecer, já idosa, nas reuniões dos Poetas Emergentes. Um romance indispensável na estante de qualquer manauara que seja dado a leituras, porque conta a história do surgimento desta Manaus em que vivemos. O livro em questão data de 1972, e está pedindo uma nova reedição pela qualidade da obra.
Numa terra em que só se falam em duas mulheres beletristas e soterram, não sei por que cargas d'água, as outras. Albertina Costa Rego de Albuquerque tem nome seguro entre as duas mais afamadas desta terra, assim bem como, Lybia Ventania, Ana Zélia da Silva e outras mais.
"Nada nas conquistas de Portugal é mais extraordinário do que a conquista do Amazonas". Joaquim Nabuco. (Epígrafe)
"Aconteceu, porém, o inesperado. Cupido entrou em cena. Flexou corações e desse modo criou novas condições para o estado de espírito coletivo. O sargento Guilherme Valente, da guarnição do Fortim de São José, à cuja sombra nasceu Manaus, uniu-se a uma cunhã da região, pondo termos aos conflitos e autorizando o início da fase de compreensão e de cooperação mútuas". Explicava Arthur Cezar Ferreira Reis, no prefácio do livro.
Cap. 28
(...)- A propósito, Guilherme, quero lhe dizer, temos que arranjar um nome para nosso povoado. Nas minhas correspondências, uso assim, casa Forte de São José do Rio Negro, mas isto não está certo, Casa Forte é só o Quartel. É muito vago, isso aqui não compreende mais apenas o Fortim. É grande povoação.Quem está lá do outro lado, pode pensar que existe aqui apenas a Fortaleza com meia dúzia de homens, dentro. Os Missionários que vêm aqui, e as canoas de tropa de resgate usam denominações várias. É "Lugar da Barra", "Barra", "Barra do Forte", "Ponta do Forte", "Barra do Rio Negro". Confusão. Devemos usar um nome só, e que lembre nosso esforço, a nossa liderança. Esta aldeia é nossa, é nosso trabalho, nossa obra, a ela estamos dando toda a nossa vida, viemos jovens, e estamos ficando velhos, nossos companheiros ficaram sacrificados aqui.
- Sabe, devemos dar o nome de cidade dos "Manaus" é muito justo, principalmente, agora que há a tribo dos Passés, dos Banibas e dos Barés, e gente de malocas diversas, morando aqui. Os Manaus devem ter a primazia porque foram os que de fato nos ajudaram e nos deram credenciais para fazer amizades com outras clãs. O povo manau é de fato nosso amigo. (...)
Cap. 30
Guilherme narra a Manaus do futuro. A Manaus que conhecemos, ou que viríamos a conhecer: estou vendo no casario que se derrama aí fora nessas ondulações, uma cidade encantadora. Prédios de alvenaria, altos, muitos andares, alvinhos de cal, enfeites, vidraças, monumentos. Ruas calçadas, alegria, animação, carruagens, sol coruscante, jovens casais passeando, esquinas de comércio movimentado. Uma lindeza! E a eterna cobiça dos outros povos, porque isso aqui, é de verdade, a Terra da promissão.
Maria fitou o esposo com os olhos esbugalhados.
- Meu Deus! Está variando, meu pai está muito doente.
Nunca vi papai delirar. Onde está mamãe? Mamãe...
-É certo, estou vendo, concluiu Guilherme com a voz arrastada, - estou vendo uma coisa maravilhosa, a minha cidade.
Maria cobria o rosto com as mãos, chorando desesperadamente.
Guilherme calou-se. Com os olhos muito abertos, permanecia sereno, numa imobilidade de pedra. O genro segurava-lhe o pulso.
Morria assim, suavemente, diante das duas filhas prediletas - Maria, o primeiro rebento de seu corpo, e, de sua alma, a obra-prima, MANAUS.
domingo, 19 de outubro de 2014
CURIOSIDADE LITERÁRIA
Manuel Bandeira e Luiz Bacellar tiveram a mesma ideia, ambos traduziram o haicai de Bashô. Vejam como ficou na tradução de Bandeira:
Quimonos secando
ao sol. Oh aquela manguinha
da criança morta!
E agora observem a de Bacellar:
Kimonos ao sol.
Agitou-se a manga
Do menino morto.
Pode-se perceber que Bandeira foi fiel à métrica do haicai com as 17 sílabas. O que não se observa em Bacellar. Mas ambos não perderam a originalidade.
Quimonos secando
ao sol. Oh aquela manguinha
da criança morta!
E agora observem a de Bacellar:
Kimonos ao sol.
Agitou-se a manga
Do menino morto.
Pode-se perceber que Bandeira foi fiel à métrica do haicai com as 17 sílabas. O que não se observa em Bacellar. Mas ambos não perderam a originalidade.
quarta-feira, 15 de outubro de 2014
HOMENAGEM
Há 15 anos o Brasil perdia um dos seus maiores nomes na literatura, o poeta João Cabral de Melo Neto. Dono de um estilo único se dizia odiar os decassílabos pelo fato de ter que ouvir todos os dias sonetos lidos na escola. Quando se descobriu poeta, pode perceber que poderia criar uma obra em que cada verso valesse um soneto. Talvez, por isso, sua obra é tão singular.
Nasceu no Recife, a 6 de janeiro de 1920, filho de Luiz Cabral de Melo e de Carmem Carneiro Leão Cabral de Melo, de antigas famílias de Pernambuco e Paraíba. Pelo lado paterno é quarto neto de Antônio de Moraes e Silva, o Moraes do dicionário, e primo de Manuel Bandeira e Mauro Mota. Pelo lado materno é primo de Gilberto Freyre e do historiador José Antônio Gonsalves de Melo. Foi eleito por unanimidade para Academia Brasileira de Letras em 1968, na vaga de Assis Chateaubriand.
Obras do autor:
Pedra do sono (1940-1941)
O engenheiro (1942-1945)
Psicologia da composição (1946)
O cão sem plumas ( 1949-1950)
Paisagens com figuras (1954-1955)
Uma faca só lâmina (1955)
Quaderna (1956)
Serial (1959-1961)
A educação pela pedra (1962-1965)
POÉTICA
Pro João Cabral de Melo Neto
No espelho branco
seu verso franco
desenha a imagem
em paralaxe
do torso tempo:
anticrástino
e face vária
amplo templo.
No espelho franco
seu verso nácar
lavou o rosto
sem ter disfarce
e criou asas
e bateu asas
e voou longe
nas asas do tempo...
Miguel de Souza
segunda-feira, 6 de outubro de 2014
IPÊS
Os ipês estão todos floridos, lindos ornando a floresta, a cidade. Em setembro adentrando outubro, pelo menos em Manaus, eles dão o ar de sua graça, e infestam as nossas retinas com suas cores belíssimas. Parabéns a quem tem a sensibilidade de perceber sua presença. O poeta que tem o dom de transformar a natureza em versos não ficou de fora dessa, e Carlos Drummond de Andrade, preparou uma justa homenagem a esse tempo... Tempo de ipê.
TEMPO DE IPÊ
Não quero saber de IPM, quero saber de IP.
O M que se acrescentar não será de militar,
Será de Maravilha.
Estou abençoando a terra pela alegria do ipê.
Mesmo roxo, o ipê me transporta ao círculo da alegria,
onde encontro, dadivoso, o ipê-amarelo.
Este me dá as boas-vindas e apresenta:
-Aqui é o ipê-rosa.
Mais adiante, seu irmão, o ipê-branco.
Entre os ipês de agosto que deveriam ser de outubro
Mas tiveram pena de nós e se anteciparam
Para que o Rio não sofresse de desamor, tumulto, inflação, mortes.
Sou um homem dissolvido na natureza.
Estou florescendo em todos os ipês.
Estou bêbado de cores de ipê, estou alcançando
A mais alta copa do mais alto ipê do Corcovado.
Não me façam voltar ao chão,
Não me chamem, não me telefonem, não me dêem dinheiro,
Quero viver em bráctea, racemo, panícula, umbela.
Este é tempo de ipê. Tempo de glória.
Carlos Drummond de Andrade.
In: Amar se Aprende Amando.
HAICAIS
É tempo de ipê:
Que belo, o ipê-amarelo
contemplo do apê.
Aquele é o ipê-rosa Que infesta toda a floresta
cena dadivosa.
É a vez do ipê-roxo
Que encena uma bela cena
Pesar do tom coxo.
Agora o ipê-branco
Invade assim a cidade
Com tom lindo, franco.
Miguel de Souza
TEMPO DE IPÊ
Não quero saber de IPM, quero saber de IP.
O M que se acrescentar não será de militar,
Será de Maravilha.
Estou abençoando a terra pela alegria do ipê.
Mesmo roxo, o ipê me transporta ao círculo da alegria,
onde encontro, dadivoso, o ipê-amarelo.
Este me dá as boas-vindas e apresenta:
-Aqui é o ipê-rosa.
Mais adiante, seu irmão, o ipê-branco.
Entre os ipês de agosto que deveriam ser de outubro
Mas tiveram pena de nós e se anteciparam
Para que o Rio não sofresse de desamor, tumulto, inflação, mortes.
Sou um homem dissolvido na natureza.
Estou florescendo em todos os ipês.
Estou bêbado de cores de ipê, estou alcançando
A mais alta copa do mais alto ipê do Corcovado.
Não me façam voltar ao chão,
Não me chamem, não me telefonem, não me dêem dinheiro,
Quero viver em bráctea, racemo, panícula, umbela.
Este é tempo de ipê. Tempo de glória.
Carlos Drummond de Andrade.
In: Amar se Aprende Amando.
HAICAIS
É tempo de ipê:
Que belo, o ipê-amarelo
contemplo do apê.
Aquele é o ipê-rosa Que infesta toda a floresta
cena dadivosa.
É a vez do ipê-roxo
Que encena uma bela cena
Pesar do tom coxo.
Agora o ipê-branco
Invade assim a cidade
Com tom lindo, franco.
Miguel de Souza
quarta-feira, 1 de outubro de 2014
POEMICROS
cobrança
não se cobra
da cobra
aquele que é um primordial
ofício das aves:
voar!
relógio
o tic-tac
da engrenagem
dita a norma do tempo:
passar!
ampulheta
pingar de luzes efêmeras
-grão ante grão-
que se liquefazem diásporas
no vão tempo
sonoro!
balanço
me balanço
no balanço
e o balanço
me balança
o balanço
do tempo
ceifa II
despetalei flores
na certeza
de um bem-me-quer
e o tempo choveu-me dúvidas!
Miguel de Souza
não se cobra
da cobra
aquele que é um primordial
ofício das aves:
voar!
relógio
o tic-tac
da engrenagem
dita a norma do tempo:
passar!
ampulheta
pingar de luzes efêmeras
-grão ante grão-
que se liquefazem diásporas
no vão tempo
sonoro!
balanço
me balanço
no balanço
e o balanço
me balança
o balanço
do tempo
ceifa II
despetalei flores
na certeza
de um bem-me-quer
e o tempo choveu-me dúvidas!
Miguel de Souza
sábado, 13 de setembro de 2014
SOBRE POEMAS
A RIMA EM AUTOPSICOGRAFIA
"O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração."
Fernando Pessoa
A rima em Autopsicografia é alternada por estar distribuída em A/B/A/B, C/D/C/D, E/F/E/F. Na primeira estrofe, a rima "A" ("fingiDOR"/"DOR"), é aguda, consoante e rica. Aguda por se tratar de palavras oxítonas. Consoante pela semelhança de consoantes e vogais. Rica por pertencer à classe gramatical diferente. FINGIDOR: adjetivo; DOR: substantivo. Já a rima "B" ("sENTE/completamENTE"), é grave, consoante e rica. Grave por ser formada por palavras paroxítonas. Consoante pela semelhança de consoantes e vogais. Rica por ser de categoria gramatical distinta. SENTE; verbo; COMPLETAMENTE: advérbio.
Na segunda estrofe, a rima "C"("escrEVE"/"tEVE"), é grave por ser formada por palavras paroxítonas. Consoante pela semelhança entre consoantes e vogais. Pobre por pertencer à mesma categoria gramatical. Já a rima "D" ("BEM"/TÊM"), é aguda por ser formada por palavras agudas ou oxítonas. É consoante, por mostrar semelhança entre consoantes e vogais. É rica por pertencer à classe gramatical diferente. Pelo critério fônico, a igualdade de sons entre as palavras que rimam se dá antes da vogal tônica: "BEM/TÊM" que é o "e"; tendo como consoante de apoio, o "B" e o "T", respectivamente.
Na terceira estrofe, a rima "E" ("RODA"/"CORDA"), é grave, consoante e rica. Grave por serem palavras paroxítonas. Consoante pela semelhança de consoantes e vogais. Rica por serem de categoria gramatical diferente. Isto é: "RODA": verbo; "CORDA": substantivo. Já na rima "F" ("RAZÃO"/"CORAÇÃO"), é aguda, consoante e pobre. Aguda por serem palavras oxítonas. Consoante pela semelhança de consoantes e vogais. Pobre por ser de categoria gramatical semelhante. Isto é: "RAZÃO" substantivo de dois gêneros; "CORAÇÃO": substantivo de dois gêneros.
"O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração."
Fernando Pessoa
A rima em Autopsicografia é alternada por estar distribuída em A/B/A/B, C/D/C/D, E/F/E/F. Na primeira estrofe, a rima "A" ("fingiDOR"/"DOR"), é aguda, consoante e rica. Aguda por se tratar de palavras oxítonas. Consoante pela semelhança de consoantes e vogais. Rica por pertencer à classe gramatical diferente. FINGIDOR: adjetivo; DOR: substantivo. Já a rima "B" ("sENTE/completamENTE"), é grave, consoante e rica. Grave por ser formada por palavras paroxítonas. Consoante pela semelhança de consoantes e vogais. Rica por ser de categoria gramatical distinta. SENTE; verbo; COMPLETAMENTE: advérbio.
Na segunda estrofe, a rima "C"("escrEVE"/"tEVE"), é grave por ser formada por palavras paroxítonas. Consoante pela semelhança entre consoantes e vogais. Pobre por pertencer à mesma categoria gramatical. Já a rima "D" ("BEM"/TÊM"), é aguda por ser formada por palavras agudas ou oxítonas. É consoante, por mostrar semelhança entre consoantes e vogais. É rica por pertencer à classe gramatical diferente. Pelo critério fônico, a igualdade de sons entre as palavras que rimam se dá antes da vogal tônica: "BEM/TÊM" que é o "e"; tendo como consoante de apoio, o "B" e o "T", respectivamente.
Na terceira estrofe, a rima "E" ("RODA"/"CORDA"), é grave, consoante e rica. Grave por serem palavras paroxítonas. Consoante pela semelhança de consoantes e vogais. Rica por serem de categoria gramatical diferente. Isto é: "RODA": verbo; "CORDA": substantivo. Já na rima "F" ("RAZÃO"/"CORAÇÃO"), é aguda, consoante e pobre. Aguda por serem palavras oxítonas. Consoante pela semelhança de consoantes e vogais. Pobre por ser de categoria gramatical semelhante. Isto é: "RAZÃO" substantivo de dois gêneros; "CORAÇÃO": substantivo de dois gêneros.
sábado, 30 de agosto de 2014
HAIKAI
Haikai (Haiku ou haikai) é uma forma poética de origem japonesa, que valoriza a concisão e a objetividade. Os poemas têm três linhas, contendo na primeira e na última cinco caracteres japoneses (totalizando cinco sílabas) e sete caracteres na segunda linha (sete sílabas).
Em japonês, haiku são tradicionalmente impressos em uma única linha vertical, enquanto haiku em Língua Portuguesa geralmente aparecem em três linhas, em paralelo. Muitas vezes, há uma pintura a acompanhar o haicai ( ela é chamada de haiga). "Haijin" é o nome que se dá aos escritores desse tipo de poema, o principal haijin (ou haicaista), dentre os muitos que se destacaram nessa arte, foi Matsuô Bashô (1644-1694), Que se dedicou a fazer do haicai uma prática espiritual.
HAICAI NO BRASIL
Segundo Mr. Hoigays (1988), o primeiro autor brasileiro de haicai foi Afrânio Peixoto, em 1919, através de seu livro Trovas Populares Brasileiras, onde prefaciou suas impressões a respeito do poema japonês:
"Os japoneses possuem uma forma elementar de arte, mais simples ainda que a nossa trova popular: é o haikai, palavra que nós ocidentais não sabemos traduzir senão com ênfase, é o epigrama lírico. São tercetos breves, versos de cinco, sete e cinco pés, ao todo dezessete sílabas. Nesses moldes vazam, entretanto, emoções, imagens, comparações, sugestões, suspiros, desejos, sonhos... de encanto intraduzível.
Quem o popularizou, porém, foi Guilherme de Almeida, com sua própria interpretação da rígida estrutura de métrica, rimas e titulo. No esquema proposto por Almeida, o primeiro verso rima com o terceiro, e o segundo verso possui uma rima interna (A segunda sílaba rima com a sétima sílaba). A forma de haicai de Guilherme de Almeida ainda tem muitos praticante no Brasil.
Outra corrente do Haicai brasileiro é a tradicionalista, promovida inicialmente por imigrantes ou descendentes de imigrantes japoneses, como H. Masuda Goga e Teruko Oda. Esta corrente define haicai como um poema escrito em linguagem simples, sem rima, estruturados em três versos que somem dezessete sílabas poéticas; cinco sílabas no primeiro verso, sete no segundo e cinco no terceiro. Além disso, o haikai tradicional deve conter sempre uma kigo. Estas são palavras ou frases, utilizadas na poesia japonesa que têm uma associação com uma estação do ano. (Ex.: "sakura", flor de cerejeira é associada à Primavera).
Como fonte nipônca do ainda haiku, em sua forma original, GOGA atribui aos imigrantes japoneses, que começa com a chegada do navio Kassato Maru ao porto de Santos em 18 de junho de 1908, nele estava Shuhei Uetsuka (1876-1935), um bom poeta de haiku, conhecido como Hyôkotsu, Consta ter sido a sua primeira produção, momentos antes de chegar ao porto de Santos, o seguinte haiku:
A nau intrigante
chegando: vê-se lá do alto
a cascata seca.
Foi na década de 1930 que aconteceu o intercâmbio e difusão do haiku entre os haicaistas japoneses e brasileiros, constituindo-se, assim, outro caminho do haicai no Brasil. Foi naquela década também que apareceu a mais antiga coletânea de haicais chamada simplesmente Haicais, de Siqueira Júnior, publicada em 1933. Guilherme de Almeida, no ano anterior, havia publicado Poesia Vária, mas o livro não era exclusivamente de haicais. Fanny Luiza Dupré, foi a primeira mulher a publicar um livro de haicais, em fevereiro de 1949, intitulado Pétalas ao Vento- Haicais, As rotas do haicai no Brasil podem ser resumidas cronologicamente da seguinte forma:
* Em 1879, através do livro da França ao Japão, de Francisco Antônio Almeida.
* Em 1908, através da chegada dos imigrantes japonese ao porto de Santos.
* Em 1919, através do livro Trovas Populares Brasileiras de Afrânio Peixoto.
* Em 1926, através do cultivo e difusão do haiku dentro da colõnia por Keiseki e Nenpuku.
Na década de 1930, através do intercâmbio dos haicaistas japoneses e brasileiros, principalmente pelo próprio H. Masuda Goga.
Com a ambientação e difusão do haiku em lígua portuguesa, algumas correntes de opinião sobre este se formaram:
* A corrente dos defensores do conteúdo do haiku;
* A corrente dos que atribuem importância à forma.;
* A corrente dos admiradores da importância do kigo.
Os defensores do conteúdo do haiku são aqueles que consideram algumas características do poema peculiares, como concisão, a condensação, a intuição e a emoção, que estão ligadas ao zen-budismo. Oldegar Vieira é um haicaista que aderiu a essa corrente.
Os que consideram a forma (teikei) a mais importante seguem a regra das 17 sílabas poéticas (5-7-5). Guilherme de Almeida não só aderiu essa corrente como criou uma forma peculiar de compor os seus poemas chamados de haicais "guilherminos". Abaixo, a explicação da forma conforme o gráfico que o próprio Guilherme elaborou:
-------------------------X
------O-------------------------O
-------------------------X
Além de rimar o primeiro verso com o terceiro e a segunda sílaba com a sétima do segundo verso, Guilherme dava título aos seus haicais. Exemplo (GOGA, 1988, p. 49):
Histórias de algumas vidas
Noite. Um silvo no ar,
Ninguém na estação. E o trem
passa sem parar.
Os admiradores da importância do kigo respeitam em seus haicais o termo ou palavra que indique a estação do ano. Jorge Fonseca Júnior, é um deles. Apesar de existirem essas distinções retratadas aqui como correntes, nomes como o de Afrânio Peixoto, Millôr fernandes, Guilherme de Almeida, Waldomiro Siqueira Júnior, Jorge Fonseca Júnior, Wenceslau de Moraes, Oldegar Vieira, Abel Pereira e Fanny Luiza Dupré são importantes na história do hacai no Brasil.
EXEMPLOS
Pétala caiu
se quis colorir o chão
fez bem, conseguiu.
Carlos Antonholi
no despenhadeiro
a sombra da pedra
cai primeiro
Carlos Seabra
a grama cortada
espalha um perfume novo
no velho jardim
Zemaria Pinto
Bênção para os olhos-
na queimada da floresta
a orquídea resiste.
Aníbal Beça
Rasteja no chão
como a beleza de um tapete
sonolento: a grama.
Anísio Mello
Casa de cupim
na ponta do pau do poste...
Fósforo gigante!
Luiz Bacellar
Na tarde ampla e calma
o sino é um óleo divino
ungindo-nos a alma.
Alencar e Silva
o ar eclode lento,
em bolha, e por toda folha
instaura vento.
Ernesto Penafort
Perfume das flores
suor e mãos calejadas
ofício de jardineiro.
Rayder Coelho
Ah, que maravilha
De roxas e rubras coxas
Goza a buganvília.
Sérgio Luiz Pereira
Na encharcada relva
sobre o escuro e frio rio Negro.
Raios propagam luz.
Michele Pacheco
Chamuscar de sol:
a labareda esquenta a
tarde tropical.
Miguel de Souza
Em japonês, haiku são tradicionalmente impressos em uma única linha vertical, enquanto haiku em Língua Portuguesa geralmente aparecem em três linhas, em paralelo. Muitas vezes, há uma pintura a acompanhar o haicai ( ela é chamada de haiga). "Haijin" é o nome que se dá aos escritores desse tipo de poema, o principal haijin (ou haicaista), dentre os muitos que se destacaram nessa arte, foi Matsuô Bashô (1644-1694), Que se dedicou a fazer do haicai uma prática espiritual.
HAICAI NO BRASIL
Segundo Mr. Hoigays (1988), o primeiro autor brasileiro de haicai foi Afrânio Peixoto, em 1919, através de seu livro Trovas Populares Brasileiras, onde prefaciou suas impressões a respeito do poema japonês:
"Os japoneses possuem uma forma elementar de arte, mais simples ainda que a nossa trova popular: é o haikai, palavra que nós ocidentais não sabemos traduzir senão com ênfase, é o epigrama lírico. São tercetos breves, versos de cinco, sete e cinco pés, ao todo dezessete sílabas. Nesses moldes vazam, entretanto, emoções, imagens, comparações, sugestões, suspiros, desejos, sonhos... de encanto intraduzível.
Quem o popularizou, porém, foi Guilherme de Almeida, com sua própria interpretação da rígida estrutura de métrica, rimas e titulo. No esquema proposto por Almeida, o primeiro verso rima com o terceiro, e o segundo verso possui uma rima interna (A segunda sílaba rima com a sétima sílaba). A forma de haicai de Guilherme de Almeida ainda tem muitos praticante no Brasil.
Outra corrente do Haicai brasileiro é a tradicionalista, promovida inicialmente por imigrantes ou descendentes de imigrantes japoneses, como H. Masuda Goga e Teruko Oda. Esta corrente define haicai como um poema escrito em linguagem simples, sem rima, estruturados em três versos que somem dezessete sílabas poéticas; cinco sílabas no primeiro verso, sete no segundo e cinco no terceiro. Além disso, o haikai tradicional deve conter sempre uma kigo. Estas são palavras ou frases, utilizadas na poesia japonesa que têm uma associação com uma estação do ano. (Ex.: "sakura", flor de cerejeira é associada à Primavera).
Como fonte nipônca do ainda haiku, em sua forma original, GOGA atribui aos imigrantes japoneses, que começa com a chegada do navio Kassato Maru ao porto de Santos em 18 de junho de 1908, nele estava Shuhei Uetsuka (1876-1935), um bom poeta de haiku, conhecido como Hyôkotsu, Consta ter sido a sua primeira produção, momentos antes de chegar ao porto de Santos, o seguinte haiku:
A nau intrigante
chegando: vê-se lá do alto
a cascata seca.
Foi na década de 1930 que aconteceu o intercâmbio e difusão do haiku entre os haicaistas japoneses e brasileiros, constituindo-se, assim, outro caminho do haicai no Brasil. Foi naquela década também que apareceu a mais antiga coletânea de haicais chamada simplesmente Haicais, de Siqueira Júnior, publicada em 1933. Guilherme de Almeida, no ano anterior, havia publicado Poesia Vária, mas o livro não era exclusivamente de haicais. Fanny Luiza Dupré, foi a primeira mulher a publicar um livro de haicais, em fevereiro de 1949, intitulado Pétalas ao Vento- Haicais, As rotas do haicai no Brasil podem ser resumidas cronologicamente da seguinte forma:
* Em 1879, através do livro da França ao Japão, de Francisco Antônio Almeida.
* Em 1908, através da chegada dos imigrantes japonese ao porto de Santos.
* Em 1919, através do livro Trovas Populares Brasileiras de Afrânio Peixoto.
* Em 1926, através do cultivo e difusão do haiku dentro da colõnia por Keiseki e Nenpuku.
Na década de 1930, através do intercâmbio dos haicaistas japoneses e brasileiros, principalmente pelo próprio H. Masuda Goga.
Com a ambientação e difusão do haiku em lígua portuguesa, algumas correntes de opinião sobre este se formaram:
* A corrente dos defensores do conteúdo do haiku;
* A corrente dos que atribuem importância à forma.;
* A corrente dos admiradores da importância do kigo.
Os defensores do conteúdo do haiku são aqueles que consideram algumas características do poema peculiares, como concisão, a condensação, a intuição e a emoção, que estão ligadas ao zen-budismo. Oldegar Vieira é um haicaista que aderiu a essa corrente.
Os que consideram a forma (teikei) a mais importante seguem a regra das 17 sílabas poéticas (5-7-5). Guilherme de Almeida não só aderiu essa corrente como criou uma forma peculiar de compor os seus poemas chamados de haicais "guilherminos". Abaixo, a explicação da forma conforme o gráfico que o próprio Guilherme elaborou:
-------------------------X
------O-------------------------O
-------------------------X
Além de rimar o primeiro verso com o terceiro e a segunda sílaba com a sétima do segundo verso, Guilherme dava título aos seus haicais. Exemplo (GOGA, 1988, p. 49):
Histórias de algumas vidas
Noite. Um silvo no ar,
Ninguém na estação. E o trem
passa sem parar.
Os admiradores da importância do kigo respeitam em seus haicais o termo ou palavra que indique a estação do ano. Jorge Fonseca Júnior, é um deles. Apesar de existirem essas distinções retratadas aqui como correntes, nomes como o de Afrânio Peixoto, Millôr fernandes, Guilherme de Almeida, Waldomiro Siqueira Júnior, Jorge Fonseca Júnior, Wenceslau de Moraes, Oldegar Vieira, Abel Pereira e Fanny Luiza Dupré são importantes na história do hacai no Brasil.
EXEMPLOS
Pétala caiu
se quis colorir o chão
fez bem, conseguiu.
Carlos Antonholi
no despenhadeiro
a sombra da pedra
cai primeiro
Carlos Seabra
a grama cortada
espalha um perfume novo
no velho jardim
Zemaria Pinto
Bênção para os olhos-
na queimada da floresta
a orquídea resiste.
Aníbal Beça
Rasteja no chão
como a beleza de um tapete
sonolento: a grama.
Anísio Mello
Casa de cupim
na ponta do pau do poste...
Fósforo gigante!
Luiz Bacellar
Na tarde ampla e calma
o sino é um óleo divino
ungindo-nos a alma.
Alencar e Silva
o ar eclode lento,
em bolha, e por toda folha
instaura vento.
Ernesto Penafort
Perfume das flores
suor e mãos calejadas
ofício de jardineiro.
Rayder Coelho
Ah, que maravilha
De roxas e rubras coxas
Goza a buganvília.
Sérgio Luiz Pereira
Na encharcada relva
sobre o escuro e frio rio Negro.
Raios propagam luz.
Michele Pacheco
Chamuscar de sol:
a labareda esquenta a
tarde tropical.
Miguel de Souza
sexta-feira, 22 de agosto de 2014
OSWALD X SONETO
Antes, eu achava que o poeta Oswald de Andrade, haveria perdido uma ótima oportunidade de mexer no soneto. De desestruturá-lo como ele fez com a balada, por exemplo. Hoje, com um pouco mais de leitura, penso diferente.
O soneto é uma forma fixa desenvolvido em quatro estrofes, sendo elas: duas quadras e dois tercetos. O mais usado pelos poetas é o decassílabo, que contem dez sílabas métricas, podendo ser sáfico: com cesuras nos pares 4-8-10. Ou heroico: com pausas na sexta e décima sílabas métricas.
Provindo de uma Escola Literária que trazia um nova visão de arte, o Modernismo. Oswald de Andrade, um dos principais membros dessa Escola, introduziu no Brasil, uma nova maneira de fazer poesia. Uma poesia curta, satírica, sintética, que parecia mais um esboço de um poema, e que por essa razão, não foi aceito pela súcia, acostumada à métrica e à rima dos sonetos Parnasianos.
Mas Oswald, não só não mexeu na estrutura do soneto. Enquanto muitos se curvaram aos seus quatorze golpes, como Manuel Bandeira por ser de origem Parnasiana. Carlos Drummond de Andrade, que dizia que seu maior sonho era ter feito parte do Parnasianismo. Até mesmo Mário de Andrade, que se mostrou bem econômico em relação aos sonetos. Ele o deixou irretocável, isto é, simplesmente o ignorou.
Esta, com certeza, foi a maior resposta que alguém poderia ter dado.e que passa despercebido na ótica de muitos bambambãs por aí. Mas tarde, Augusto dos Anjos incorpora ao soneto palavras apoéticas, não usadas até então em poesia. Foi uma audácia. Mas ninguém foi tão espetacular quanto aquele que, a meu ver, foi 100% Modernista.
O soneto é uma forma fixa desenvolvido em quatro estrofes, sendo elas: duas quadras e dois tercetos. O mais usado pelos poetas é o decassílabo, que contem dez sílabas métricas, podendo ser sáfico: com cesuras nos pares 4-8-10. Ou heroico: com pausas na sexta e décima sílabas métricas.
Provindo de uma Escola Literária que trazia um nova visão de arte, o Modernismo. Oswald de Andrade, um dos principais membros dessa Escola, introduziu no Brasil, uma nova maneira de fazer poesia. Uma poesia curta, satírica, sintética, que parecia mais um esboço de um poema, e que por essa razão, não foi aceito pela súcia, acostumada à métrica e à rima dos sonetos Parnasianos.
Mas Oswald, não só não mexeu na estrutura do soneto. Enquanto muitos se curvaram aos seus quatorze golpes, como Manuel Bandeira por ser de origem Parnasiana. Carlos Drummond de Andrade, que dizia que seu maior sonho era ter feito parte do Parnasianismo. Até mesmo Mário de Andrade, que se mostrou bem econômico em relação aos sonetos. Ele o deixou irretocável, isto é, simplesmente o ignorou.
Esta, com certeza, foi a maior resposta que alguém poderia ter dado.e que passa despercebido na ótica de muitos bambambãs por aí. Mas tarde, Augusto dos Anjos incorpora ao soneto palavras apoéticas, não usadas até então em poesia. Foi uma audácia. Mas ninguém foi tão espetacular quanto aquele que, a meu ver, foi 100% Modernista.
sexta-feira, 15 de agosto de 2014
SOB O VÉU DA AMIZADE
EVERALDO NASCIMENTO
Encontrei-me com o poeta Everaldo Nascimento, meu amigo de tantas empreitadas e tantos projetos literários, como a Folha do Poeta: suplemento literário há quinze anos divulgando a poesia; CESPOE (Concurso Estudantil de Poesias) e tantos outros.
Presenteou-me com uma coletânea poética: Poetas da Folha/Cartilha Literária/2014 do Projeto Cultural Boa Leitura! Onde figuram por lá: Manoel Assis, Ana Zélia, Amy Higgins Schneider, Israel Guerra, Nazaré Campos, Harlheinz Schneider, Isabelle França e o próprio Everaldo Nascimento.
Tenho profunda gratidão ao poeta e compositor Everaldo Nascimento, por ter me inserido nos seus projetos e ter me dado asas para alçar meus rasantes voos literários. Lembro-me do CESPOE de 1999, onde classifiquei um soneto intitulado "Um doente", foi o meu primeiro texto publicado nas páginas de um livro. Como fiquei feliz! Depois vieram outros CESPOES, e a vida seguiu sua trilha.
Costumo dizer que se existe alguém que merece ser homenageado nesta cidade é o Everaldo Nascimento, por ter sido o precursor nessa história toda de recitais nas escolas. Quando eu era aluno no meu tempo de ginásio nas escolas por onde estudei não me recordo de ter ido por lá, nenhum poeta famoso ou não, levar sua mensagem através da poesia, até mesmo pra incentivar os neófitos. Não tinham essa preocupação.
Hoje, sinto uma ponta de orgulho por ter encabeçado juntamente com o Everaldo Nascimento, esse movimento literário tão importante nas escolas, e por ter seguido em frente com o CLAM.
CANTO
Para Everaldo Nascimento
Vou tecer um soneto neste momento,
-e explicar o motivo deste canto-,
ao meu amigo Everaldo Nascimento,
cujos versos são magias e encantos.
Agradeço também aos bons ventos,
que me trouxeram vates tantos, tantos...
através do que estava no teu intento,
confortando-nos com o teu acalanto.
Foi por pensares sempre em conjunto,
que nesta caminhada estamos juntos,
para tentarmos publicar nossos versos.
E, quem sabe, no mais tardar dos anos,
possamos ver, enfim, os nossos planos,
realizados com bastante sucesso!
Miguel de Souza
domingo, 10 de agosto de 2014
11 DE AGOSTO, DIA DE SANTA CLARA DE ASSIS
SANTA CLARA
Santa Clara, clareai!
Clareai o meu pensamento
o meu dia, a minha hora
clareai o meu momento.
Santa Clara, clareai!
Clareai a minha cabeça
a minha ideia, o meu intento
e tudo que nela aconteça.
Santa Clara, clareai!
Clariai o meu caminho
os meus passos, a minha estrada
desviai dela os espinhos.
Santa Clara, clareai!
Clareai a minha vida
o meu mês, o meu ano
cada hora minha vivida.
Santa Clara, clareai!
Clareai o meu mundo
o meu instante, o meu agora
o meu desejo mais profundo.
Santa Clara, clareai...
E intercedei por mim
junto ao Pai.
Miguel de Souza
ORAÇÃO A SANTA CLARA DE ASSIS
Pela intercessão de Santa Clara, O Senhor todo poderoso me abençoe e proteja; volte para mim os seus olhos misericordiosos, me dê a paz, a tranquilidade; derrame sobre mim as suas copiosas graças; e depois desta vida, me aceite no céu em companhia de Santa Clara e de todos os santos. Em nome do Pai. do Filho e do Espírito Santo. Amém.
Santa Clara, clareai!
Clareai o meu pensamento
o meu dia, a minha hora
clareai o meu momento.
Santa Clara, clareai!
Clareai a minha cabeça
a minha ideia, o meu intento
e tudo que nela aconteça.
Santa Clara, clareai!
Clariai o meu caminho
os meus passos, a minha estrada
desviai dela os espinhos.
Santa Clara, clareai!
Clareai a minha vida
o meu mês, o meu ano
cada hora minha vivida.
Santa Clara, clareai!
Clareai o meu mundo
o meu instante, o meu agora
o meu desejo mais profundo.
Santa Clara, clareai...
E intercedei por mim
junto ao Pai.
Miguel de Souza
ORAÇÃO A SANTA CLARA DE ASSIS
Pela intercessão de Santa Clara, O Senhor todo poderoso me abençoe e proteja; volte para mim os seus olhos misericordiosos, me dê a paz, a tranquilidade; derrame sobre mim as suas copiosas graças; e depois desta vida, me aceite no céu em companhia de Santa Clara e de todos os santos. Em nome do Pai. do Filho e do Espírito Santo. Amém.
sexta-feira, 8 de agosto de 2014
SOBRE LIVROS
Um novo livro de poemas nasceu. Assim como surgem os poemas, também surgem os livros. A partir da minha loucura pelo Ernesto Penafort, a meu ver, um dos melhores poetas desta terra. Tive
a ideia de desmembrar um dos seus magníficos poemas: "Calendário Interior".
Transformei-o em dez dísticos e dois monósticos que funcionam como epígrafes dos sonetos shakespearianos, uma das estruturas preferidas do Ernesto. Para cada mês, um soneto.
Os sonetos são uma continuação do pensamento do poeta. Uma afirmação nos dísticos e nos monósticos, segundo o meu desmembramento. Intitulei-o Ciclo, e, claro, é dedicado ao próprio Ernesto pelo grande poeta que é. O poema Calendário Interior vem na íntegra no final do livro.
Eis alguns sonetos:
ERNESTO PENAFORT
III
sentindo março
nó no cadarço
E.P.
sentindo março bem firme
bater à porta da casa
(o relógio que não atrasa)
e, com prazer, agora ir-me
seguir o sol do meu dia
para cumprir minha meta
por causa do grande poeta
quatorze reina a poesia
e o nó que outro vate trouxe
afrouxo do meu cadarço
pois, já é passado março
nesta vida a trouxe-mouxe
e que venha o mês seguinte
com sua senha, requinte!
VII
em vindo julho
no ar fagulho
E.P.
em vindo julho sem folga
sem dia útil pro descanso
em teus dias úteis me canso
e esse teu mar me afoga
também, em ti, o meu fagulho
uma suave centelha
em tuas horas parelhas
onde, exótico mergulho
e vão se passando as horas
as horas formando os dias
e, seguem-se na porfia
até o mês ir embora
para vir, enfim, agosto
o mês duro do desgosto
IX
feito setembro
mais eu me lembro
E.P.
feito setembro na trilha
mais eu me lembro da cor
azul que o poeta, com amor
dita, e do quanto ela brilha!
mais eu me lembro do AZUL
GERAL , primeiro dos livros
e que ainda hoje está vivo
em Manaus de norte a sul
e me lembro d'A MEDIDA
DO AZUL. Também de OS LIMITES
DO AZUL, que sem ter limite
comoveu-nos toda a vida!
mais eu me lembro do Ernesto
da sua poesia, estro!
Miguel de Souza
CALENDÁRIO INTERIOR
quando é janeiro
planto primeiro
em fevereiro
colho em paneiro
sentindo março
nó no cadarço
pondo-se abril
mão no fuzil
se o mês é maio
encho o balaio
e se faz junho
cerro o meu punho
em vindo julho
no ar fagulho
dando-se agosto
escondo o rosto
feito setembro
mais eu me lembro
o cinza rubro
cinzela outubro
já que é novembro
fogo em dezembro
Ernesto Penafort
a ideia de desmembrar um dos seus magníficos poemas: "Calendário Interior".
Transformei-o em dez dísticos e dois monósticos que funcionam como epígrafes dos sonetos shakespearianos, uma das estruturas preferidas do Ernesto. Para cada mês, um soneto.
Os sonetos são uma continuação do pensamento do poeta. Uma afirmação nos dísticos e nos monósticos, segundo o meu desmembramento. Intitulei-o Ciclo, e, claro, é dedicado ao próprio Ernesto pelo grande poeta que é. O poema Calendário Interior vem na íntegra no final do livro.
Eis alguns sonetos:
ERNESTO PENAFORT
III
sentindo março
nó no cadarço
E.P.
sentindo março bem firme
bater à porta da casa
(o relógio que não atrasa)
e, com prazer, agora ir-me
seguir o sol do meu dia
para cumprir minha meta
por causa do grande poeta
quatorze reina a poesia
e o nó que outro vate trouxe
afrouxo do meu cadarço
pois, já é passado março
nesta vida a trouxe-mouxe
e que venha o mês seguinte
com sua senha, requinte!
VII
em vindo julho
no ar fagulho
E.P.
em vindo julho sem folga
sem dia útil pro descanso
em teus dias úteis me canso
e esse teu mar me afoga
também, em ti, o meu fagulho
uma suave centelha
em tuas horas parelhas
onde, exótico mergulho
e vão se passando as horas
as horas formando os dias
e, seguem-se na porfia
até o mês ir embora
para vir, enfim, agosto
o mês duro do desgosto
IX
feito setembro
mais eu me lembro
E.P.
feito setembro na trilha
mais eu me lembro da cor
azul que o poeta, com amor
dita, e do quanto ela brilha!
mais eu me lembro do AZUL
GERAL , primeiro dos livros
e que ainda hoje está vivo
em Manaus de norte a sul
e me lembro d'A MEDIDA
DO AZUL. Também de OS LIMITES
DO AZUL, que sem ter limite
comoveu-nos toda a vida!
mais eu me lembro do Ernesto
da sua poesia, estro!
Miguel de Souza
CALENDÁRIO INTERIOR
quando é janeiro
planto primeiro
em fevereiro
colho em paneiro
sentindo março
nó no cadarço
pondo-se abril
mão no fuzil
se o mês é maio
encho o balaio
e se faz junho
cerro o meu punho
em vindo julho
no ar fagulho
dando-se agosto
escondo o rosto
feito setembro
mais eu me lembro
o cinza rubro
cinzela outubro
já que é novembro
fogo em dezembro
Ernesto Penafort
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