sábado, 30 de dezembro de 2017

OFICINA IRRITADA

Eu quero compor um soneto duro
como poeta algum ousara escrever.
Eu quero pintar um soneto escuro,
seco, abafado, difícil de ler.

Quero que meu soneto, no futuro,
não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que, no seu malígno ar imaturo,
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.

Esse meu verbo antipático e impuro
há de pungir, há de fazer sofrer,
tendão de Vênus sob o pedicuro.

Ninguém o lembrara: tiro no muro,
cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.

Carlos Drummond de Andrade
In: Claro Enigma
P. 42

domingo, 24 de dezembro de 2017

NATAL

É Natal mais u’a vez no calendário.
Do maior homem que passou pela terra, e
deu exemplo de como se vence a guerra,
o mundo comemora o aniversário.
               
Da Paz e do Amor, Ele foi operário,
perdoando, por sua vez, o que erra,
abrandando os corações em guerra,                              
ceifando todo aquele sofrer diário.

Por isto, desde sempre, eu me lembro,
que em vinte e cinco de dezembro,
é festejado em todo o mundo, o Natal!

Negros e brancos, ricos e pobres,
gente humilde ao lado de gente nobre,
todos se unem ao redor desse sinal.

Miguel de Souza

sábado, 16 de dezembro de 2017

MAXIMÍNIMAS

SONETOS SOBRE AFORISMOS

                 “Só existe duas regras para escrever: ter algo a dizer e dizê-lo.”
                                                                                                Oscar Wilde

XXI

Aquele que acha que para escrever,
É preciso viver intensamente!
Não compreendeu o que Adélia quis dizer,
Com seu aforismo a toda essa gente!

E continua, bem sei eu, sem entender
Muito bem o aforismo, infelizmente!
Vivendo a vida apenas por viver,
Sendo cético, ateu, sem fé, descrente...

Pois, aquele dizer em forma de culto,
Que o poeta, lá no fundo, “nasce adulto,”
Tem causado nos outros, desmantelo!

É como Oscar Wilde, na epígrafe, diz
Seu aforismo deveras feliz:
“Basta ter algo a dizer e dizê-lo!”

Miguel de Souza

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

INVASÃO II

Homem de Ferro com Homem de Pedra,
A Coisa. Vêm me oferecer ajuda!
- Robbin diz: “pelas barbas de Judas!”
 E o Homem Invisível nada medra!

Batman, o Homem Morcego, qual quem redra,
Convoca o Super-Man p’ra que me acuda!
Em cenas oníricas, quase mudas,
O Homem Mola dali, não se apedra.

O Capitão América com seu escudo,
Vem me livrar também daquilo tudo!
Com raiva, o Incrível Hulk rasga a calça...

Homem Pássaro voa livre no espaço,
Imitando assim o nosso Homem de aço,
Que seu atlético vôo também ele alça.    


Miguel de Souza

domingo, 3 de dezembro de 2017

SANTA BÁRBARA

                
                      04 de dezembro, dia de Santa Bárbara.

Oh, Santa Bárbara, Mártir e Virgem:
Padroeira das trovoadas, tempestades;
Livrai-nos dessas vis atrocidades,
Que se acometem desde Vossa origem.

Fazei com que o bom tempo não se tinja
De negror pelo mapa da cidade, e
Que diante de Jesus, com Vossa autoridade,
O pedido por nós não se restrinja...

Oh, Santa Bárbara, querida e fiel, a
Reinar incólume nas plagas do céu,
Intercedei por nós junto a Jesus!

Abrandai, Oh, Gloriosa Virgem Santa,
Das aflições perturbadoras, tantas,
Concedendo-nos força, fé e luz!
Miguel de Souza

sábado, 25 de novembro de 2017

FRUTAS DA MINHA INFÂNCIA

IV.Goiabarana

Imponente ao pé da cerca
Com esverdeadas abas...
Tem certeza, não é goiaba?!
Vou tratar do assunto acerca
Dessa prima muito próxima
Da goiaba, a goiabarana.
Tinha um gosto bem bacana
Que comia e achava ótima!
Mas, para saboreá-la,
Carecia certo roubo...
Da infância, o primeiro arroubo,
Pelo prazer de degustá-la!
E nunca mais, pude enfim,
Sentir seu sabor assim!

Miguel de Souza
In: Chibé na cuia

domingo, 19 de novembro de 2017

REAÇÕES DE OLAVO BILAC

Julho, 19 - Na livraria José Olympio, a conversa com Órris Soares recai sobre Da Costa e Silva, falecido há pouco. pergunto-lhe se conheceu o poeta, e ele responde:
          - Fomos amigos e contemporâneos no Recife. Em 1906 ou 7, presenciei uma cena que jamais contei a ele. Naquele ano passaram pelo Recife três celebridades a bordo de um navio que vinha da Europa e seguia para Buenos Aires. A primeira era um cavalo de raça, que custava 800 contos de réis. A segunda era Sarah Bernhardt, ainda sem perna artificial, pois a amputação se deu em 1915. E a terceira era Olavo Bilac. Então, disse-me o diretor do Jornal Pequeno. "Seu Órris, você que arranha francês, vá a bordo e procure entrevistar a divina Sarah." "Pois não." Entrei no navio e barraram-me o acesso à atriz. Insisti, e o secretário foi inflexível. Desanimado, tentei ver o cavalo. Mas ele também estava rodeado de admiradores e cuidados, e não pude aproximar-me. Restava o poeta. João do Rio, também de passagem pelo Recife, e a quem eu já conhecia do Rio de Janeiro, levou-me até ele. Estávamos os três conversando quando chegou um rapaz de olhos divergentes e disse a Bilac: "Mestre, eis aqui o meu livro Sangue, que acacba de aparecer. "Disse mais duas ou três palavras e retirou-se, deixando o volume nas mãos dele. Bilac adiantou-se, ergueu a mão e, dizendo: "Poetas e bananas só produzem doenças no Brasil", lançou o livro ao mar.
          De passagem, retifico que o fato deve ter ocorrido em 1908, ano de publicação de Sangue.
          - Em 1915 - prossegue Órris - publiquei uma peça de teatro, A Cisma. Peguei alguns exemplares e fui oferecer aos grandes do tempo. Encontro Bilac na rua e entrego-lhe o volume. Ele recebe amavelmente e diz: "Vou ler este seu livro com o mesmo apreço e simpatia que li os anteriores..." Eu nunca tinha publicado nada antes.
          - Em 1917, plena guerra européia, estávamos Paulo da Silveira e eu na Lopes Fernandes - uma casa de refresco que havia na Avenida Rio Branco. Chega Bilac, e Paulo convida-o para sentar-se à nossa mesa. Ele aceita, e Paulo interpela-o sobre a guerra. "Não me fale de guerra, se por acaso você for partidário da Alemanha", retruca o poeta. "Eu detesto a Alemanha. Detesto Goethe, detesto Wagner, detesto chucrute...".
          Última e implacável revelação de Órris sobre o Príncipe dos Poetas:
          - Um dia, eu e Heitor Lima conversávamos sobre Augusto dos Anjos, de cuja morte eu acabara de ter notícia por um telegrama. Aparece Bilac e pergunta sobre o que estávamos falando. Heitor conta-lhe que era sobre a morte do poeta Augusto dos Anjos. "E que poeta era esse?", indaga Bilac. Como resposta, Heitor diz um poema de Augusto. Bilac ouve e comenta: "Pois eu acho que ele devia ter morrido antes de escrever uma barbaridade dessas."

Carlos Drummond de Andrade
In: O Observador no Escritório
P. 90/91

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

HOMENAGEM

Neste dia 16 faria aniversário a minha querida amiga Ana Zélia da Silva. Autora do livro de poemas MULHER! CONQUISTA FÁCIL!..., ela soube traduzir em poemas as mazelas que nos circundam, que nos rodeiam. Mulher de uma verve impressionante! Autora de: Ah! Se eu tivesse tido chance! ( uma obra-prima!), Mulher! É o bicho!... O que sou, Vício, A mensagem da vela... entre outros formidáveis poemas.

O QUE SOU.

Orgulhosamente. MULHER.
Vaidosamente. CABOCLA.
Psicologicamente: REBELDE, ORGULHOSA,
VAIDOSA, MULHER.

Tenho dois nomes de mulher.
Ao nascer na certidão recebi um número, passei a ser numeral.
O fantasma me persegue em tudo.

Na escola desde a matrícula, a chamada na classe é em número,
perde-se a identidade pessoal.
CI, CPF, Conta bancária, funcional...
Os números me perseguem. Sou humana, mortal.

Há professores que ousam trocar o nome de
cada aluno por números.
Número um, dois, três...

Com a morte, receberei três números.
Um no atestado de óbito,
outro no RG do cemitério e um número último,
o da sepultura.

É a vida.

Ana Zélia
In: Mulher! Conquista fácil!...
P. 31 

sábado, 11 de novembro de 2017

Dezembro, 29

- Esse diabo de Baudelaire, dizendo que a inspiração consiste em trabalhar todo dia. E onde fica a minha preguiça de intelectual, que se imagina produtora de grandes obras quando a inspiração for servida?

Carlos Drummond de Andrade
In: O observador no escritório
P. 64


 A MUSA VENAL

Ó musa de minha alma, amante dos palácios,
Terás, quando janeiro desatar seus ventos,
No tédio negro dos crepúsculos nevoentos,
Uma brasa que esquente os teus dois pés violáceos?

Aquecerás teus níveos ombros sonolentos
Na luz noturna que os postigos deixam coar?
Sem um níquel na bolsa e seco o paladar,
Colherás o ouro dos cerúleos firmamentos?

Tens que, para ganhar o pão de cada dia,
Esse turíbulo agitar nas sacristias,
Entoar esse Te Deum que nada têm de novo,

Ou, bufão em jejum, exibir teus encantos
E teu riso molhado de invisíveis prantos
Para desopilar o fígado do povo.

Charles Baudelaire
In: Las flores del mal (As flores do mal)

sábado, 4 de novembro de 2017

SÃO FRANCISCO

CONVERSA ÍNTIMA

Meu amigo Francisquinho,
sou ainda um animal
selvagem e agressivo,
desce do alto aonde estás
e vem até aonde eu vivo.
Conversavas com os
 pássaros, peixes, leões,
conversa também comigo,
serão momentos tão bons,
Tu, me explicando o sentido
do amor e da humanidade,
eu, te contando o que sinto:
meus fracassos, minhas revoltas,
o medo que tenho, não minto,
de enfrentar a humanidade
que ao voltares ao céu
levarás mais uma graça,
pois, me tornarás tão passiva,
como a mais tranquila ovelhinha
do rebanho de Jesus.
Francisquinho, meu amigo,
vem agora, estou sozinha,
tenho a noite por abrigo,
preciso da tua luz.
Deixaste glórias, riquezas,
para seres o mais pobre
entre os pobres de Assis.
Eu sou pobre de ternura,
pobre sou de esperança,
conversa comigo meu Santo
como se eu fosse uma criança
de alma, de lírio entreaberto,
que a Tua palavra, prometo,
não se perderá no deserto.
Sei que Foste meio louco,
com ideias liberais,
dava tudo o que era Teu,
para a mágoa dos teus pais.
Dá-me agora o teu amparo,
teus exemplos e conselhos,
como amigo e doce irmão.
Não vou cair de joelhos
nem ficar em contrição,
mas sim, olhar nos Teus olhos,
segurar firme Tua mão,
e ficar junto a Ti,
meu amado Francisquinho,
até aprender contigo
a ser generosa e humilde
a fim de seguir o teu caminho.

Violeta Branca
In: Reencontro
P. 63/64

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

DIA DE FINADOS

A EXISTÊNCIA

Ando a esmo pela estrada da vida,
Juntando os cacos da existência morta!
Que um dia, veio ávida, à minha porta,
E a esta matéria ofereceu guarida!

Hoje, a quimera toda combalida,
Jaz fúnebre no nicho dessa horta!
E a minha vida toda se transporta,
A uma nova existência, uma outra vida!

Sem perder a aparência d'antanho,
Sinto-me solto, leve, quiçá estranho,
E recupero a arcada dentária!

O tempo inerte, estagnou-se na mente,
Não se envelhece mais! E de repente,
Continua-se com a mesma faixa-etária!
Miguel de Souza

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

O PATARRÃO



Lembro de tantas personagens, tantas!
Que preencheram minha doce infância...
Não se perderam em meio à distância,
E, revisitam-me minha mente... Oh, quantas!

O “Patarrão:” – Êta velho sacripantas!
Morava de aluguel em uma estância,
Sobressaia-se em meio à concamitância
Daqueles que afrontavam sua santa

Paciência por causa dessa alcunha!
Aí, ninguém, ao menos, supunha
Das loucuras de que ele era capaz:

Certa feita, correu atrás de mim,
Como um habilidoso espadachim,
Culpando-me por ser um tanto falaz.

                               Miguel de Souza

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Ana Zélia da Silva (16.11.1943 - 16.10.2017)



PERFIS

Da performance da atriz
que nos palcos está em voga,
da advogada que não advoga
pelos cantos do país.

Da mulher que nunca joga
e sempre soube o que diz,
da locutora de folga
retrato aqui seus perfis.

Da poetisa aguerrida
pelas coisas da Amazônia:
-um símbolo em nossas vidas!-

Um exemplo de coragem, e
como todo vate sonha,
a Ana Zélia esta homenagem.

Miguel de Souza
In: Poemais
P. 53

P.S. A minha gratidão sempre a Ana Zélia da Silva, ela que surfava nas ondas sonoras de uma rádio, divulgando os valores da terra no seu Momento Poético. Quanta saudade!


TRAVESSIA DA POETA

O barco chegou.
A poeta atravessou.

Mas antes cantou
a última canção:

Uma balada emotiva
de sonora comoção.

Celebrou a vida.
No badalar do coração.

O barco chegou...

Gadi

*Homenagem do Gadi ao saber do passamento da poetisa.

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

MILAGRES DE NOSSA SENHORA APARECIDA

                                                
                                                                                                                                                  







A LIBERTAÇÃO DO ESCRAVO ZACARIAS

O escravo Zacarias parte em fuga,
Por achar esquisita a sua vida;
E é capturado logo em seguida,
Por seu senhor que o prende e o subjuga.
                 
Mas quando, ao ser levado de volta,
Passaram próximo da capelinha,
Ele pediu pra junto à imagenzinha,
Apesar de ser vítima de escolta,

Rezar com sua fé na Virgem Santa.
A fé em Nossa Senhora foi tanta,
Que as correntes e argolas que ele tinha,

Romperam-se e quedaram-se aos seus pés!
Seu senhor deu-lhe a sua liberdade,
E Zacarias, um dos filhos mais fiéis.


O pequeno mendigo paralítico

A imagem da Virgem Santa: Nossa
Senhora da Conceição Aparecida,
Diante daquela gente tão sofrida,
que se acotovelavam a Vossa

presença, ávidos por um milagre;
parece exercer algum fascínio,
por internalizar em seus escrínios,
curas a quem o povo Vos consagre!

Pois, veio de Barra Mansa a notícia,
De um menino quase paralítico,
Que ouviu o conselho de um missionário.

Envolto no apogeu de suas primícias,
Tendo na Virgem Santa, algo mítico,
O mesmo foi curado com o novenário.


 A menina esfaqueada

A imagem da Santa estava esposta,
E vinha todo dia rezar uma menina,
Que tinha sido péssima a sua sina,
Pois, fora vítima de uma ira posta a

Ela, por um imigo de seu pai!
Que, com ares maldosos, assassinos,
Mudara o curso do seu destino,
transformando sua vida num grande ai!

Um dia, pede à sua mãe uma moeda,
Para depositar ao pé da imagem,
Impossível para alcançar a altura!

Com fé, e sem temer aquela queda,
A menina vestiu-se de coragem,
E ofertou-a à Santa. E obteve a cura!


Diante de uma onça feroz

Este fato narrado por carta,
Ocorreu na Fazenda das Araras:
Tiago Terra que por lá andara,
E de Nossa Senhora não se aparta,

Foi surpreendido por uma feroz
Onça, que atravessou seu caminho;
Sem armas e, sem forças e, sozinho...
Só lhe restou recorrer-vos a Vós!

E deu um grito forte de socorro:
– Valha-me, minha Mãe Aparecida!
Que a onça assustada saiu à direita,

Deixando Tiago ileso, num modorro,
Agradecendo à Santa pela vida,
Por ser até hoje pessoa escorreita!


A serra elétrica parou milagrosamente

Dos milagres de Nossa Senhora,
Esse foi mais um feito nessa terra:
De ter parado a elétrica serra,
No exato instante, em cima da hora

De decepar o braço do Seu José.
Que estava a fazer um reparo,
Sem saber que custava tão caro, e
Foi salvo, dessa forma, pela fé!

Pois ele ficou com o braço preso,
Mas saiu daquilo tudo são, ileso,
P’la fé depositada em Nossa Senhora.

E naquele momento de perigo,
Clamou à Nossa Senhora Aparecida! E digo
Que ele foi atendido nessa hora!
            
 Sentiu um toque sobrenatural e ficou curada

Desenganada pela medicina,
Recolhida, imóvel, ao seu leito,
Sua vida não teria outro jeito,
Era mesmo de dar dó sua sina!

Foi quando teve a ideia de pagar
Uma promessa feita, e não cumprida!
A Nossa Senhora Aparecida,
E ir à Vossa capela visitar.

Após longo tempo de muita reza,
Como uma devota que se preza.
Sentiu um toque sobrenatural!

Com muito esforço conseguiu mover-se,
Daí a pouco, por completo, locomover-se,
Afastando de si aquele mal!

Miguel de Souza




sábado, 7 de outubro de 2017

DOMINGO

                                                                                             
Domingo não é dia de feira.
É dia de fazer feira.
Dia de feira é de segunda a sexta.
Exceto o sábado, é claro.


                         Miguel de Souza

sábado, 30 de setembro de 2017

SOBRE POEMAS



Outro dia, encontrei um poema solto dentro do livro de um poeta espanhol que havia conhecido em trânsito por Manaus. Sinceramente não me lembro de quem, e nem como esse poema foi parar lá! No final do texto, deparei-me com uma assinatura, creio eu, do autor daquela obra. Mesmo assim, não me ocorreu a lembrança de ninguém.
Costumo guardar todos os poemas que recebo de amigos poetas. Tenho vários... Mas não conheço nenhum Noel Yvel. Poderá ser um pseudônimo talvez, não sei! Um dia, quem sabe, quando estiver com a cuca fresca, eu me recorde desse nobre poeta e, depois de uma boa gargalhada, peça desculpas a ele, pelo mico do esquecimento.
Ou quem sabe, você meu “anônimo amigo” está lendo este texto, nesse exato momento, e se divertindo com essa situação. Certa feita, numa conversa com uma amiga, proferi a seguinte frase: “não vejo o poeta na poesia, e sim, a poesia no poeta.” Isto deve consolar-te um pouco, acho. O fato é que nunca mais me esqueci desta frase que soou como um pensamento. Assim como acho que quem deve aparecer é a minha poesia, e não eu.
Achei deveras interessante teu poema meu caro. É emblemático. Enigmático. Filosófico. Espiritual. Fala de amizade. Parece realmente me conhecer profundamente, se é que alguém conhece alguém profundamente. E no final se despede com um adeus. É lindo e triste!
Não sou um sujeito curioso. Mas gostaria realmente de saber quem seria o poeta de tão maravilhoso poema que estava ali, dentro daquele livro, esperando uma mão que o recolhesse para a salutar leitura. Lembrou-me um soneto que fiz outro dia: “Apresentação”, pelas circunstâncias que os envolve.


ANÔNIMO AMIGO

Irmão,
sou teu anônimo amigo, laboras como eu
todo dia de sol a sol.
Em te ver, eu me vejo.
Porque também vivencio esta busca
que alguns chamam de felicidade.

Todo dia eu te vejo. Você também me vê.
O teu semblante hoje é diferente de ontem.
Também, eu sou diferente.
Nós temos mil faces. Porém , somos os mesmos
de todos os dias.

Teu nome? O que fazes? Não sei! Oxalá soubesse.
Maior seria minha admiração por ti.
Quantas qualidades tu ocultas, exclusivamente tuas.

Sabe amigo,
talvez nunca mais nos encontremos.
Porém, recebe de mim profundo sentimento de gratidão.
Pois, contigo aprendo dia a dia,
a suportar as dores do mundo.
Obrigado meu anônimo amigo,
que a paz do Senhor te acompanhe.

Noel Yvel 

sábado, 23 de setembro de 2017

O POVO

                                         Ao povo brasileiro
1      
                                  O povo, na verdade, é um cavalo,
2                                                       Que colocaram nele uma antolha!
3                                                        Direcionando-o para onde ele olha,
4                                                        Causando na nação grande abalo.

5                                                         E quando, com alguns deles, resvalo,
6                                                         Com dó fico, por essa tal escolha!
7                                                         Eles são como o vento, e o povo a folha,
8                                                         Que é levado por eles ao ralo!...

9                                                          “Liberta Barrabás e prende Jesus”,
1                                   A plebe, sem inteligência, luz,
1                                   Clamou assim praticando injustiça.

1                                                           O povo, no passar do tempo, é o mesmo...,
1                                                           E a conseqüência das bobagens a esmo,
1                                  Sofremos todos numa fé postiça!

                                            Miguel de Souza



sábado, 16 de setembro de 2017

SOBRE LIVROS



Acredito que os poetas não deveriam lançar livros. Pois o que fica são os poemas soltos, fora da amarra enfileiradas de páginas e mais páginas amontoadas em bibliotecas que pouca gente lê. Em contrapartida, os livros servem para apurar esses poemas que se sobressaem sobre os outros. Em se tratando de livros sou mesmo assim.
Querem ver só: dos cinquenta poemas que compõem Esconderijos do tempo, de Mário Quintana, apenas quatro foram os que se sobressaíram sobre os outros. São eles: Os poemas, Bilhete, Seiscentos e sessenta e seis e Solau à moda antiga. Não que os outros não tenham menos qualidade, não é isso. Mas foram esses que caíram na graça do povo, que é quem dita o sucesso.
Há livros que de cara não gosto. Mas depois de certo tempo, passo a amá-los! O poeta Mário Quintana foi um especialista em títulos. O livro o Aprendiz de feiticeiro, é tido como o melhor livro de poemas de Quintana. O mais maduro segundo Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade.
Em Sapato florido, há uma quebra que surpreendeu muita gente. Pois é um livro de prosa poética. O poeta deixa de lado a métrica e a rima da Rua dos cataventos Canções, para se aventurar nesse gênero limítrofe. Um livro singular na obra de Quintana. O que tenho percebido na sua poética, é que o poeta ora aqui ora acolá, continua no decorrer de sua trajetória fazendo os sonetos e as canções dos primeiros livros, principalmente em A cor do invisível. Sonetos como: As estrelas, Detrás de um muro surge a lua, Ah, os relógios... entre outros e muitas canções espalhadas pela sua trajetória, afirmam isso. 
Agora quero falar de um livro que foi amor à primeira vista: Espelho mágico. Delicioso livro. São 111 quadras de métricas variadas, com título. "São poemas breves, no qual os dois últimos versos espelham os dois primeiros, como se os invertessem," [...] Explicita Tania Franco Carvalhal, na orelha do livro.

Miguel de Souza

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

O FUMAÇA

O “Fumaça” não se foi qual fumaça,
Como se foram muitos desse tempo.
Nos percalços da vida, contratempos,
A ingerir também doses de cachaça.
                            
Como um bruto zagueiro, ele rechaça
Bem pra longe essa tal bola-tempo,
Em vão... Pois fica sempre o tal exemplo,
Ou bom ou mau que nunca mesmo passa.

Tenho asco dos que de ti, sentem asco,
Querido companheiro da infância,
Do qual o tempo, a meu ver, foi carrasco.

Como poeta que sou, extraio substância
Das substâncias contidas em frascos,
E oferto a todos minha repugnância!


Miguel de Souza


sábado, 2 de setembro de 2017

IPÊS

                                                                                                                        
É setembro, e no meio da floresta,
Os ipês com as suas flores lindas,
Dão ao mês primaveril as boas-vindas,
Espargindo aos olhares suas festas!

É setembro, e a natura se manifesta
Em quatro cores de beleza infinda,
E, ao adentrar por outubro ainda,
Não finda as cores que a retina infesta!

Das flores, com certeza, a mais formosa,
São, sem dúvida, as flores do ipê-rosa.
Mas, e as flores bonitas do ipê-branco, 

A embelezar o ambiente brando, franco?
E há ainda as flores roxas, amarelas,
A deixar as retinas sempre belas!                                                                         

 Miguel de Souza




sábado, 26 de agosto de 2017

ACADEMIA FAZ HOMENAGEM A MARCILEUDO BARROS


Conheci Marcileudo Barros no projeto da Escola de samba Reino Unido da Liberdade: “Poesia Solta na Rua”, encabeçado pelo locutor Ivan de Oliveira. Ele era um dos poetas convidados a palestrar naquela edição do projeto. Eu, um mero iniciante que fui fazer uma ponta como convidado do Everaldo Nascimento. Achei divertidíssima a sua participação, sempre com histórias bem humoradas sobre sua vida, seus amigos e sobre tudo.
Ganhei das mãos dele o livro “O boteco” que li quase de um fôlego só, por ter achado muito interessante. O livro é ótimo. Divertidíssimo. Dei boas gargalhadas com ele. Outro dia, o próprio Marcileudo me apresentou a um amigo seu, personagem vivo do livro “O boteco”. Aquilo foi mágico. Adorava puxar conversa com ele, era sempre uma aula que eu recebia sobre arte. O cara além de ótimo poeta era excelente músico, um compositor de mão cheia. Na nossa última conversa perguntei a ele qual seu processo de criação com relação à música? Reparem que interessante a resposta do cara: “Eu começo a tocar uma música que eu gosto na bateria... (imitava a bateria com a boca) e... lá pelas tantas entro com a minha composição e, assim, surge minhas músicas.

Marcileudo Barros é a prova viva de como esta cidade trata seus artistas. Desconhecido da grande massa, desvalorizado por aqueles que se cercam de meia dúzia de poetas e acham que o mundo gira em torno desses caras! Marginalizado, viveu à margem desde sempre. Mas foi uma porrada na face de muita gente que se esconde por trás de preconceitos bobos. Ficou seu legado: seus livros, seus poemas, suas músicas, sua voz.

Marcileudo Barros


PASSAGEM

Soube da tua passagem...
aos sessenta e quatro anos,
viajaste a outro plano,
chegaste à terceira margem

como tantos, sem despedida!
sem lenço e sem acenos,
com esse teu ar sereno,
porque foi assim tua vida!

Agora, dirás poemas
em vão, no vão desse nada,
nessa imensa madrugada
de sotilégios e dilemas.

e segues tirando sarro,
mestre Marcileudo Barros.

Miguel de Souza


*Poema composto em razão de seu passamento.





l MOSTRA DE POESIA - DA PRAÇA PARA ACADEMIA


domingo, 20 de agosto de 2017

INVASÃO lll


                                                                                                      
A Mulher Maravilha saca o laço,
E a Mulher Gato ensaia o seu miau...
Enquanto a BatGirl tange todo o mal,
Que estava perturbando o meu espaço.

                                                             SuperGirl voa rumo ao meu encalço,
                                                             E pousa firme bem no meu quintal;
                                                             E a Mulher Invisível some, a tal
                                                             Ponto de me deixar em embaraços!

Quando a luta, no fundo, se acirra,
Aparece, na minha frente, a She-Ra,
Trazendo junto com ela Arlequina.

                                                            As Negras: Fênix, Gata e Viúva
                                                            Vestem, guerreiras, seus pares de luvas,
                                                             E mostram a vaidade das heroínas!

                                                 Miguel de Souza

  

domingo, 13 de agosto de 2017

Saudade


                                           Para meu pai
A saudade o tempo leva,
E traz no dia seguinte;
E soma-se mais de vinte
Anos que naquela leva,
Te foste deste convívio,
Habitar em outra esfera!
De repente esta atmosfera,
A teus pés tornou-se ínvio...
Agora,és todo abstrato!
-Fiel criatura no adro-,
A tua imagem no quadro,
Imitando o teu retrato,
     Dignifica a memória,
     Daquele que ficou na história.

Miguel de Souza
In: Flores e Pedras









sábado, 5 de agosto de 2017

CÓLERA

Às vezes paro no bulício da vida,
a contemplar os gestos do mundo, e
fico pasmo segundo a segundo,
com o que vejo nesta luta renhida!

E viro fera, às vezes, espavorida!
e, de raiva, rancor, também me inundo,
com a injustiça corroendo a fundo,
a alma do povo sem gozar guarida!

e, se me perco a calma, eu sei, às vezes,
por saber que nos próximos 48 meses,
somos nós quem regemos o futuro...

É porque a culpa é somente nossa,
de colocar lá no poder quem possa,
atravancar esta nação no escuro.

Miguel de Souza
In: Poemais
P. 89

sábado, 29 de julho de 2017

PARABÉNS!

Aniversaria hoje o meu sobrinho Helton Silva, no auge dos seus 35 anos de caminhada. Sempre o vejo meio que descompromissado com as coisas que a vida nos impõe. A tocar sua viola, a viver sua vida! Mas sei que não é bem assim. É impressão minha! Enquanto, envolto com meus poemas, eu vou vivendo com a dura responsabilidade de criar e criar! Foi numa dessas observações que criei o soneto Seria bom. Parabéns!



SERIA BOM
                                    Pro Helton, sobrinho.

É tão bom ter a mente sempre vaga,
e não se preocupar em fazer versos;
ser anônimo, ter outro universo,
outro zéfiro que meu rosto afaga!

É tão bom concorrer a outra vaga,
e dos poemas, ser sempre meio disperso;
e, no mar de palavras, não está imerso,
e esquecer para sempre a sua saga!

Seria bom, se no abrir das cortinas,
fosse branda, essa minha triste sina...
Eu viveria como qualquer um!

Mas só tive no meu destino a sorte
de carregar nos ombros o suporte,
que carrega todo homem incomum!

Miguel de Souza