LIRA
INFAUSTA
Quando a flecha do destino
Feito luz de estrela ingrata
Varar-lhe o amargo peito,
Cessará o Amor-imperfeito
Que habitam os tormentos?
Oh, Lira infausta da morte
Tu que és tão bela e sábia
E embala o coração que sofre
Finda essa triste noite que corre
Feito largo e tenebroso rio.
Dá-lhe jazigo ao moribundo cravo
E faz o canto da rasga mortalha
-Sombrias e tristíssimas cantigas-
Velar as mazelas adormecidas
Que regam seus eternos pesares!
E, quando o palácio azul do céu
Abrir o fosco véu de suas portas
Possam as lágrimas opulentas
Sobrestar as dores violentas
Que enluta o seu infeliz coração!
Eylan
Lins
Numa breve passagem pelo título, para poder entender a junção
dessas palavras, cheguei à seguinte conclusão: lira, como se sabe é um instrumento de cordas dedilhadas usado na
antiguidade. Mas no sentido figurado, quer dizer criação poética, poesia. Já a
palavra infausta significa infeliz,
funesto. Isto me faz entender que Lira
Infausta significa poesia infeliz. (Ou canção infeliz, para soar melhor.)
O texto em questão foi dividido em quatro estrofes de cinco
versos cada. Sem rimas perfeitas e heterométricos. O que me faz entender que é
um texto de forma livre. Nos três primeiros versos o poeta usa da metáfora para
falar da morte. “Quando a flecha do
destino / Feito luz de estrela
ingrata / Varar-lhe o amargo peito
[...] Ora, o que é essa flecha do destino? E essa luz de estrela ingrata?
(há aqui uma inversão de valores: as estrelas não nos devem gratidão, por isto,
não podem ser ingratas.) A varar o amargo peito? Se não a própria morte. Nos
dois últimos versos da primeira estância, o autor se abstém de qualquer
afirmação sobre uma continuação da vida após a morte: Cessará o amor imperfeito /
Que habitam os tormentos? [...]
A segunda estrofe é um diálogo entre o eu
poético e a morte. Há aí a entrega do que ele tanto resguardara na estância
acima. Traz nos três primeiros versos palavras como bela, sábia, sofre que se
entremeiam costurando como se fosse uma teia a conceituar a morte. E nos dois
últimos versos, o apelo seguido de uma comparação: Finda essa triste noite que corre / Feito largo e tenebroso rio.
Na terceira estância duas palavras me chamaram a atenção cravo e regam, coincidentemente ou não,
no primeiro e último verso. Duas palavras que se locupletam que se
interdependem. Mas que estão distantes no poema. O eu poético se autodenomina
cravo, um cravo convalescente e, logo, o poeta invoca a rasga mortalha que
anuncia com seu canto agourento a morte. O autor transforma duas palavras
aparentemente boas, sublimes; em palavras obscuras, más: Dá-lhe jazigo ao moribundo cravo / [...] Que regam seus eternos
pesares!
Na quarta e última estrofe do poema, por fim, o eu poético se vê defronte de sua morte! E quando o palácio azul do céu / Abrir o fosco véu de suas portas [...]
Nos três últimos versos, o poeta nos fala do arrependimento e nos entrega a
palavra infeliz numa referência ao
título, quem sabe.
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