Certa feita eu fui convidado para ler
poemas num determinado lugar. Como era um ambiente em que não ia com freqüência,
e teria por lá um público, pelo menos em sua maioria, novo. Resolvi levar
alguns poemas de cunho social. Após a leitura de alguns poemas já conhecidos
como aqueles que figuram n’A Quinta Estação, fiz a leitura, enfim, dos sonetos
escolhidos por mim para aquela noite. Dentre eles: “Mariposas”, um soneto sobre
as prostitutas, e “Feito um filho da puta”, uma crítica sobre o engodo que os
operários sofrem na pele, enfim...
O fato é que depois, ouvi críticas de
algumas pessoas que me acompanham e estão sempre na plateia: - você não deveria
falar palavrão, eu não esperava isso de você. Desde então fiquei inquieto com
aquilo tudo. É preciso entender o poeta.
O palavrão só é palavrão quando é dito
aleatório, sem direção, quando não tem um endereço. Quando é direcionado, ele
deixa de ser palavrão e passa a ter o conteúdo daquela mensagem. Portanto,
minha cara, os dois “palavrões” empregados no soneto, apesar de soarem como
tal!...
Peço desculpas se decepcionei alguém.
Mas sempre vou estar do lado dos menos favorecidos, dos descamisados, dos
desdentados, dos descalçados, das prostitutas, dos mendigos, dos mal amados, dos
maltrapilhos, dos operários que suam a camisa de sol a sol, dos garis que
varrem as ruas, dos jardineiros que embelezam as praças e de todos aqueles que
não têm voz e nem vez.
Apanágio
Não sou o poeta certinho, que talvez,
Muita gente pensasse que eu fosse,
Com meus poemas incrivelmente doces,
Pra adoçar os ouvidos de uns três
Gatos pingados que, de quando em vez,
Dão o ar de sua graça, a trouxe-mouxe!
Não sou o poeta que a vida comum trouxe
Para embelezar os sonhos de quatro ou
seis...
Eu sou o poeta desses maltratados,
Dos maltrapilhos e dos mal amados,
Que não têm vez, e não há de ter voz!
Eu sou o poeta de todos os mendigos,
Das prostitutas e dos sem abrigo,
Eu sou o poeta sim, de todos vós!
Miguel de Souza
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