Um dos livros mais intrigantes da nossa literatura é "PARNASO DE ALÉM TÚMULO" (Poesias mediúnicas), primeiro livro psicografado por Francisco Cândido Xavier (Chico Xavier). Nele, encontramos poetas como Alberto de Oliveira, Alphonsus de Guimaraens, Antero de Quental, Antônio Nobre, Arthur Azevedo, Augusto dos Anjos, Auta de Souza, Casimiro de Abreu, Cruz e Sousa, Fagundes Varela, Guerra Junqueiro, Olavo Bilac, Raimundo Correia, entre outros.
Francisco Cândido Xavier
Nasceu em Pedro Leopoldo, MG, em 2 de abril de 1910, onde residiu até dezembro de 1958. Transferiu-se para Uberaba, MG, em janeiro de 1959. Filho de João Cândido Xavier e de Maria João de Deus, desencarnados em 1960 e 1915, respectivamente. Aposentou-se como funcionário público federal. Médium de atividade ininterrupta há quase meio século, publicou através da Casa-Máter do Espiritismo - Federação Espírita Brasileira, em junho de 1932, o Parnaso de Além-Túmulo, primeiro livro de suas faculdades mediúnicas,seguiram-se-lhe mais de 110 livro mediúnicos, diversos deles publicados em Esperanto, Castelhano, Japonês, Inglês e Francês. Os romances psicografados (entre eles Paulo e Estêvão, há mais de dois mil anos... e Renúncia) são periodicamente radiofonizados e televisionados. Criatura simples, afável e operosa, jamais se beneficiou dos direitos autorais de sua vasta produção mediúnica. Respeitado e estimado em todo Brasil, onde é popularíssimo, goza ele ainda de sincera admiração em outros países. Viajou para o exterior algumas vezes, sempre no exercício de seu mediunato.
DE PÉ, OS MORTOS!
Pede-me você uma palavra para o intróito de "Parnaso do Além-Túmulo" que aparecerá brevemente em nova edição.
A tarefa é difícil, Nas minhas atuais condições de vida tenho de destoar da opinião que já expendi nas contingências da carne.
Os vivos do Além e os vivos da Terra não podem enxergar as coisas através de prismas idênticos. Imagine se o aparelho visual do homem fosse acometido segundo a potencialidade dos raios X: as cidades estariam povoadas de esqueletos, os campos se apresentariam como desertos, o mundo constituíram um conjunto de aspectos inverossímeis e inesperados.
Cada esfera da vida está subordinada a certo determinismo, no domínio do conhecimento e da sensação.
Decerto, os que receberem novamente o "Parnaso de Além-Túmulo" dirão mais ou menos o que eu disse (2). Hão de estranhar que os mortos prossigam com as mesmas tendências, tangendo os mesmos assuntos que aí constituíam a série de suas preocupações. Existem até os que reclamam contra a nossa liberdade. Desejariam que estivéssemos algemados nos tormentos do inferno, em recompensa dos nossos desequilíbrios no mundo, como se se nossos amargores, daí, nos bastassem para nos inclinar à verdade compassiva.
Individualmente, é indubitável que possuímos no Além o reflexo das virtudes ou das nossas misérias.
Mas é razoável que apareçamos no mundo, gritando como alucinados? Os habitantes do reino da morte ainda apreciam o decoro e a decência, e o nosso presente é sempre a experiência do passado e a esperança no futuro.
"Parnaso de Além-Túmulo" sairá de novo, como a mensagem harmoniosa dos poeta que amaram e sofreram. Cármen Cinira aí está com os seus sonhos e desafios, de mulher e de menina, Casimiro com a sua sensibilidade infantil, Junqueiro com a sua ironia, Antero com a sua rima austera e dolorosa.
Todos aí estão dentro das suas características.
Os mortos falam e a Humanidade está ansiosa, aguardando a sua palavra.
[...]
Humberto de Campos (*)
(Espírito)
Reparem como Casimiro de Abreu não perdeu seu estro, e revela saudades do Brasil, no seu tempo encarnado na matéria.
Casimiro de Abreu
Poeta fluminense desencarnou aos 18 de outubro de 1860, na fazenda de Indaiaçu, no então município de Barra de São João, hoje denominado Casimiro de Abreu, com 21 anos de idade, acometido de tuberculose pulmonar. Figura literária da mais típicas do seu tempo, o autor malogrado de "Primaveras" ainda aqui se afirma no seu profundo quão suave nativismo lírico. Suas composições possuem "um sabor estilo colorido, sensível e personalíssimo." disse Ronald de Carvalho.
À MINHA TERRA
Que terno
sonho dourado
Das minhas
horas fagueiras,
No recanto
das palmeiras
Do meu
querido Brasil!
A vida era
um dia lindo
Num vergel
cheio de flores,
Cheio de aroma
e esplendores
Sob um céu
primaveril.
A infância,
um lago tranquilo
Onde começa
a existência,
Onde os
cisnes da inocência
Bebem o
néctar do amor.
A mocidade
era um hino
De melodias
suaves,
Formadas de
trinos de aves
E de
perfumes de flor.
O dia, manhã
ridente,
Numa canção
de alvorada;
A noite toda
estrelada
Após o doce
arrebol;
E na
paisagem querida,
Os ramos das
laranjeiras
E das
frondosas mangueiras
Douradas à
luz do sol!
Oh! Que
clarão dentro dalma,
Constantemente
cismando,
O pensamento
sonhando
E o coração
a cantar,
Na delicada
harmonia
Que nascia
da beleza,
Do verde da
natureza,
Do verde do
lindo mar!
Oh! Que
poema a existência
De infância
e de mocidade,
De ternura e
de saudade,
De tristeza
e de prazer;
Igual a um
canto sublime,
Como uma
estrofe inspirada
Na noite e
na madrugada,
Na tarde e
no amanhecer.
De tudo me
lembro e quanto!
A
transparência dos lagos,
As carícias,
os afagos
E os beijos
de minha mãe!
Dos trinos
dos pintassilgos,
Da melodia
das fontes
As nuvens
nos horizontes
Perdidos no
azul do além.
Quando eu
cruzava as campinas,
Sem sombras
de sofrimento,
Descalço,
com o peito ao vento,
Num tempo
doce e feliz!
Os
pessegueiros floridos,
As frondes
cheias de amora,
O manto de
luz da aurora,
Os pios das
juritis!
Se a morte
aniquila o corpo,
Não aniquila
a lembrança;
Jamais se
extingue a esperança,
Nunca se
extingue o sonhar!
E à minha
terra querida,
Recortada de
palmeiras,
Espero em
horas fagueiras
Um dia poder
voltar.
CRUZ E SOUZA
Catarinense. Funcionário público, encarnou
em 1861 e desprendeu-se em 1898, no Estado de Minas. Poeta de emotividade
delicada, soube, mercê de um simbolismo inconfundível, marcar sua
individualidade literária. Sua vida foi só dores.
HERÓIS
Esses seres
que passam pelas dores,
Às geenas do
pranto acorrentados,
Aluviões de
peitos sofredores,
No turbilhão
dos grandes desgraçados;
Corações a
sangrar, ermos de amores,
Revestidos
de acúleos acerados,
Nutrindo a
luz dos sonhos superiores
Nos ideais
maiores esfaimados;
Esses pobres
que o mundo considera
Os humanos
farrapos dos vencidos,
Prisioneiros
da angústia e da quimera,
São os
heróis das lutas torturantes,
Que são,
sendo na Terra os esquecidos,
Coroados nas
luzes deslumbrantes!
AUGUSTO DOS
ANJOS
Paraibano. Nasceu em 1884 e desencarnou em1914,
na cidade de Leopoldina, Minas. Era professor no colégio Pedro II
.inconfundível pela bizzarria da técnica, bem como dos assuntos de sua
predileção, deixou um só livro – Eu – que foi, aliás, suficiente para lhe dar
personalidade original.
ALMA
Nos combates
ciclópicos, titânicos,
Que eu às
vezes na Terra empreendia,
Nos vastos
campos da psicologia,
Buscava as
almas, seres inorgânicos;
Nas
lágrimas, nos risos e nos pânicos,
Nos
distúrbios sutis da hipocondria,
Nas
defectividades da estesia,
Nos instintos
soezes e tirânicos.
Somente
achava corpos na existência,
E o sangue
em continuada efervescência
Com impulsos
terríficos e tredos.
Enceguecido
e louco então que eu era,
Que não via,
dos astros à monera,
As luzes
dalmas em trágicos segredos.
GRATIDÃO A
LEOPOLDINA (*)
Sem o vulcão
de dor de hórridas lavas,
Beija,
Augusto, este solo generoso,
Que te
guardou no seio carinhoso
O escafandro
das células escravas.
Aqui,
buscaste o campo de repouso,
Depois das
vagas ríspidas e bravas
No mundo
áspero e vão, que detestavas,
E onde
sorveste o cálice amargoso.
Volta,
Augusto, do pó que envolve as tumbas,
Proclama a
vida além das catacumbas,
Nas
maravilhas de seus resplendores.
Ajoelha-te e
lembra o último abrigo,
Esquece o
travo do tormento antigo
E oscula a
destra de teus benfeitores.
_________
(*)
Poesia
recebida em 18 de julho de 1940, em Leopoldina, onde foi sepultado o poeta.
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