domingo, 4 de janeiro de 2015

SOBRE LIVROS

       

          Chegou às prateleiras o livro "Poesia Crônica" de Rojefferson Moraes, um misto de poesia e crônica como afirma o autor em sua apresentação. Nele, o leitor perambulará por uma Manaus sem maquiagem, sem enfeites, desprovida da beleza construída por falsos autores sem dor, e pela mídia vendedora de ilusões.
          "A poesia de Rojerfferson Moraes é genuinamente marginal. Não comunga da poesia água com farinha dos bons moços, não. Ela vem das feridas abertas das ruas, das entranhas dos peixes lombrados da Manaus Moderna, dos cultos em portas de puteiros, dos terreiros de umbanda e candomblé, dos filmes pornôs em salinhas escuras dos cinemas do centro, das pernas feridentas procurando agasalhos nas tábuas de assoalho, dos estalos de crânios pisoteados, do HIV estampado no leito, da bala que encontra seu descanso dos finais das tardes dos domingos faustivos... O poeta não é leso, anda antenado com seu tempo." Afirma Márcio Santana em seu prefácio.
          As prostitutas, os mendigos, os suicidas, os bebuns e tantos outros indigentes são os personagens-herois dessa veracidade que é este "Poesia Crônica" desse contador de verdades que é Rojerfferson Moraes. No mais é se deleitar ou se chocar com a leitura.

DES CURSO

Prezo a escrita sem nenhum propósito,
Que divaga, flutua, segue embriagada
Tropeçando a cada linha para depois repousar
Cansada do peso do silêncio

A escrita que surge sem a preocupação
De ser perfeita, de ser agradável,comestível
A escrita que urge, que grita, que berra, que clama
Que fere, esperneia e cai suja, sorridente, infeliz

A escrita cuspida, vomitada, expelida, arrancada
Da cadeira, da mesa, dos livros, a repousar na calçada
A ladrilhar nos regos, esgotos, nos braços vagos das ruas
Mal iluminadas pelos postes, levadas pelos ventos secos
Pelos sopros úmidos da orla das tempestades noturnas
Que me perseguem

A escrita que atropela, que esmaga, que se apodera
A escrita bamba, torpe que chora, que anda com
Os cabelos desgrenhados e o vestido esvoaçante

A escrita criança: imprevisível
A escrita corrompida: que rouba
A escrita marginal: que rapta
A escrita criminosa: que assassina
A escrita Deus: que salva, salva do marasmo,
Da constância, da mesmice das palavras ocas que não me dizem nada!
A escrita alcançável, palpável, maleável, compreensível
A escrita doentia do cotidiano que nos pertence
A escrita que nos torna animais indomáveis, sem rédeas
A escrita livre que voa, voa, se esborracha
E mancha qualquer papel...


Poesia Crônica. Manaus. Edição do autor, 2014
P. 17.

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